“Eu sei que que a Carol não vai mais voltar. Será sempre apenas visita”, diz a aposentada Sueli, 53 anos, sobre a filha. A família, de Casa Branca (SP), viu há cinco anos a jovem sair de casa para cursar psicologia em Campinas (SP). Deixou orgulho e saudade, mas também laços rompidos. “Só de ver a cama dela arrumada vinha uma sensação forte de que perdi algo”, conta a mãe. Exceção às visitas casuais de Carol, a porta do quarto ficou fechada por cerca de um ano, diz. O ambiente a lembrava todo dia do que tentava esquecer.
Além de cômodos vazios, certos objetos e atividades também são ressignificados pelos pais com a mudança de rotina, segundo Marcelo Alves, doutor em Psicologia Social e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “É uma alteração muito grande. Os pais passam a ter que ressignificar suas vidas”. Como Sueli que passou a ajudar o marido, Ademir, no comércio — pais desocupados tendem a sentir mais a perda, dizem especialistas —, após o mais novo, João, seguir o exemplo da irmã, deixando o casal sozinho, em definitivo. Eles também aderiram às redes sociais e contatam os filhos diariamente.
Privilégio que Anália de Oliveira, 82 anos, não teve quando viu a caçula, Brenda, partir para cursar o colegial em Belo Horizonte (MG). Era 1987. Na casa da família, em Campos Altos (MG), a mãe respirava preocupada. Falavam por telefone uma vez na semana. “Me senti sozinha. Meu marido viajava muito e eu tinha medo: não teria quem me levar ao médico se precisasse”, conta ela, medindo cada palavra já que, ao lado, a filha ouve atenta ao depoimento. A curiosidade é justificada. Muitos pais sofrem em segredo após a saída dos filhos. “Sabem que, se contarem, os filhos podem não ficar bem, já que têm outras tarefas e demandas”, afirma a psicóloga Alessandra Turini, da Unesp.
Os paulistanos Fábio e Ricardo, de 47 e 49 anos respectivamente, servem de exemplo. “Nunca contei para eles, mas chorava muito”, revela Caetana, 71 anos, rindo. Por opção, os irmãos saíram de casa há cerca de três décadas, em um intervalo de um ano. Mãe solteira, Caetana passou a sentir-se “inútil” e “sozinha”, mesmo trabalhando. Nunca procurou um psicólogo — por falta de “tempo e dinheiro” —, mas diz ter tido depressão. “O que mais doía é que eu tentava contar às minhas amigas o sofrimento. Mas ninguém conseguia entender”. Para ela, o tempo serviu de cura. Ou remédio, já que a cicatriz permanece e é cutucada de vez em quando, como enquanto cozinha. “O Ricardo comia muito. Em vez de um frango, sempre fazia dois”, lembra ela, saudosa.