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Óculos de perto

 

Por Ana Gabriela Zangari Dompieri

 

Na casa dos 40, algumas tarefas antes banais se atrapalham um pouco. Ler um cardápio, por exemplo, já não é lá a coisa mais fácil do mundo. As famosas letrinhas dos rótulos parecem ainda menores e, para o professor, a chamada pode virar o momento mais desafiador da aula toda. É quando se nota que existe uma grande diferença entre bater os olhos e ler uma palavra. 

 

É uma coisa pela qual todo mundo vai passar: presbiopia, quando a gente fica mais velho e, muitas vezes, começa a precisar de óculos para perto. É comum que as pessoas vão procurar o oftalmologista quando esticar ao máximo os braços já não é mais suficiente para possibilitar a leitura. Aí ou vai ao médico, ou apoia o livro e vai andando pra trás até dar… E deve ter gente que chega a fazer isso mesmo para falsear uma independência visual já esvaída. 

 

É que ninguém quer ser a velhinha compatível à figura que temos de quem coloca o óculos na ponta do nariz para ver de longe por cima. Nessa fase começamos a nos perceber tendo ações que antes chamávamos de “coisa de vó”. O mais intuitivo então é encaixar a nossa figura à figura de um idoso. Mas, pensando bem, será que o referencial de envelhecimento que temos é realmente aplicável à atualidade?

 

Porque ruga, cabelo branco e óculos para perto adquiriram um significado dado o contexto em que se inseriam. Eles, antigamente, de fato indicavam uma proximidade em relação ao início dos desajustes do corpo e à morte. Mas hoje, quando começamos a usar  óculos, muitas vezes estamos entrando no auge da nossa carreira ou até da vida pessoal. Tem gente tendo filho aos 40 com naturalidade. 

 

É uma tentação fazer piada quando a pessoa adquire seus primeiros óculos para perto. Mas, talvez seja hora de aposentar mesmo a associação de usar óculos diretamente com velhinha; ou deixar só para as piadas. Tirando a falta de praticidade de carregá-los para cima e para baixo, que é em si o maior problema para muitos, atualizar nossa percepção em torno de quem usa óculos seria um alívio para a pessoa que fica evitando pôr os óculos para fugir de uma velhice que nem é completamente sua ainda. 

 

Sim, é um baque usar esse primeiro óculos, assim como é ver sua mãe começando a precisar de um. A sensação é a mesma: alerta para o fim. Mas não deveria mais ser. Sabe, as pessoas têm percebido que precisam de óculos se maquiando para sair, lendo as instruções do vôo. 

 

Talvez o primeiro óculos pudesse ser só mais um “primeiro” na lista que citamos com carinho. Minha primeira chupeta, minha primeira lancheira, minha primeira aliança, meu primeiro carro, minha primeira casa. Talvez hoje os óculos façam mais sentido como marco de continuidade do que de fim.

 

Colaboraram: Alessandra Furlan, Maria Eugenia Bechara Zangari, Cristiane Dompieri, Jéssica Karoline e Stefany Santos

Fonte consultada: Oftalmologista Nara Ogata

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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