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Até que o Meta nos separe

 

Por Pedro Guilherme

 

Arte por Iasmin Rodrigues

 

Você está atrasado. Mas não se preocupe: tem servidor e banquinho para todo mundo. Roupa social, só se quiser, alguns convidados estão até de regatinha e chinelo. Os noivos ainda não chegaram, será que caíram no caminho? O estilo do lugar se afasta do gótico ou do barroco, está mais para um projeto de arquitetura experimental. Nesse casamento no metaverso, a igreja é a Meta, e o padre, Zuckerberg. Infelizmente, o evangelho do padre assustou os noivos, trazendo algumas inseguranças do mundo real. É seguro estar aqui? Vamos ter dinheiro para comprar o nosso terreno? E esse casamento, será que dura?

 

A ideia de metaverso já existia, mas foi a partir do anúncio recente da Meta que criou-se um alvoroço sobre o tema. Esse enorme hype acelerou a adesão das empresas a esse novo meio, ao mesmo tempo em que desviou as discussões de privacidade digital. Afinal de contas, vale lembrar que a Meta, antigo Facebook, continua campeã em polêmicas envolvendo a privacidade de dados dos usuários. Flávio Shimabukuro, especialista em segurança da informação, destaca ao claro! que o metaverso a princípio será uma terra de ninguém, já que o Direito chega para regular a partir das experiências positivas e negativas. Enquanto isso, a insegurança já pode ser traduzida em números: uma pesquisa de 2021 da NordVPN, empresa fornecedora de serviços de Rede Privada Virtual (VPN), mostrou que 87% dos entrevistados nos EUA estão preocupados quanto à privacidade caso a Meta consiga concretizar seu projeto. 

 

Além de se preocupar com seus dados, o casal ainda tem que procurar um teto para começar sua nova vida virtual. O que eles não contavam é que certos terrenos no metaverso já estão sendo comprados por grandes empresas, como Samsung e Carrefour, e vendidos por até US$ 4 milhões! Lidia Zuin, jornalista, professora e futuróloga, explica que, por trás dos espaços avaliados em milhões de dólares, há uma lógica de especulação imobiliária. Ao mesmo tempo sem fronteiras e loteado, o metaverso vive um paradoxo em sua expansão: grandes plataformas desse segmento, como a Decentraland e a The Sandbox, criam uma dinâmica de escassez para poder lucrar, em um espaço virtualmente “infinito”. Como? Lidia usa o exemplo das celebridades: a possibilidade de morar em uma casa próxima ao Leonardo DiCaprio encarece a região, criando uma dinâmica de setores e divisão social do espaço pela renda. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência. 

 

Já o neurocientista e futurista Alvaro Machado Dias traz mais uma dor de cabeça aos recém-casados: o relacionamento. A avatarização do metaverso já mobilizou investimentos milionários de grandes marcas da moda como Adidas e Nike com seu grande potencial de customização. Mas para além das roupas extravagantes, os avatares também são uma chave para se pensar em relacionamentos na plataforma. Alvaro explica que essa ferramenta pode gerar um problema sério: se por um lado ela evita vieses raciais e sexuais, por outro pode causar uma falta de identidade e de originalidade da identidade. Esta despersonalização do usuário é mais grave sobretudo quando o uso de avatares começa cedo na infância, período-chave para o neurodesenvolvimento. Um avatar, que deveria facilitar conexões, acaba distanciando a essência da pessoa em um relacionamento mais real, criando uma barreira. O primeiro casamento no metaverso já ocorreu, resta aguardar o primeiro divórcio.

 

Os noivos cruzam os olhares assustados, ouvindo o padre perguntar se aceitam. O “novo” do metaverso conserva e amplia alguns velhos hábitos, o que em um momento de iluminação, causa um mal-estar ao casal. No final das contas, você vê ambos desaparecendo do altar, noivos em fuga tirando o cabo da internet da tomada. Do fundo da igreja, os convidados perguntam: “mas e a lembrancinha em NFT?”

Colaboraram:

Alvaro Machado Dias, neurocientista e futurista

Flávio Shimabukuro, especialista em segurança da informação

Lidia Zuin, jornalista, pesquisadora e futuróloga

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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