Dezesseis de setembro de 2022. Mahsa Amini, de 22 anos, caminhava em um parque em Teerã, capital iraniana, quando foi detida pela polícia. A razão? Uma mecha do seu cabelo escapava de seu hijab, o tradicional véu islâmico.
Três dias depois, foi encontrada morta com fratura óssea e hemorragia cerebral. Seu rosto passou a ser estampado em cartazes e seu nome proclamado pelas ruas, em protestos que vieram a se tornar os maiores em décadas no Irã.
Antes da Revolução Iraniana, em 1979, que depôs a monarquia autocrática e ocidentalizada dos xás e instalou a república islâmica teocrática dos aiatolás, às mulheres muçulmanas que desejavam se cobrir era imposto o desvelamento violento. Hoje, às mulheres que não desejam se cobrir, é imposto o véu obrigatório. De símbolo de protesto, o hijab virou símbolo de opressão. O que não muda? Seus desejos seguem fraturados. Hemorrágicos.
Para que Mahsa pudesse sair do país, precisaria da permissão do seu marido. Se ele não puder, tudo bem. O seu sogro deve fazê-lo ou, na ausência dele, seus cunhados. Andar de bicicleta e cantar é proibido. Qualquer contato com outro homem com quem não tenha vínculos parentais é desencorajado em espaços públicos pela Polícia da Moralidade, divisão policial responsável por fazer cumprir os códigos de vestimenta e pudor do país.
Exílio, desobediência, incendiar o véu, cortar os cabelos: a resistência feminina é histórica e variada. Em 2006, elas saíram às ruas recolhendo assinaturas para mudar cada lei misógina do país. Em 2014, fizeram do Facebook uma plataforma de protesto, postando fotos e vídeos sem o hijab em locais públicos. Este ano, protestam em massa nas ruas.
O aumento do conflito social no Irã prova que cada desejo abafado move essas mulheres, que restam a sonhar, incansáveis, pelo mínimo. Desejos como deixar seus cabelos à mostra, sem poderem ser mortas por isso.
Colaboração: Ana Raietparvar, antropóloga pela UFF; Fernando Brancoli, professor de RI na UFRJ; Taís Penteado, advogada; Luiza Müller e Alexandre R. da Silva