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Sobre a tranquilidade do espírito

 

Por Thomas Toscano

 
Arte: Jorge Fofano

“Acostuma-te à ideia de que a morte não é nada”, diz Epicuro, filósofo helenístico. Fácil falar. A vida em suas cores e impulsos nos convida a desfrutá-la, criando desejos. Eles que nos movem, nos dão paixões, ideias e ambições. Mas a eles estamos presos, correndo para realizá-los antes de nossa hora final. 

A professora Maria Cecília Reis, tradutora da obra do filósofo, explica que, para ele, “os desejos necessários para a felicidade são: se alimentar, ter abrigo, conforto, saúde, amizades. Geram a tranquilidade da alma e são saciáveis, por isso não geram angústia”.

Mas a mente cria desejos não naturais. Fama, poder, dinheiro e até imortalidade “são desejos vãos, falsas necessidades”, complementa. Por último, os desejos naturais, mas não necessários – comer queijo em vez de pão, beber vinho e não água – , são bons em moderação, mas desnecessários para felicidade. 

O desnecessário, hoje, é essencial. A alegria é relativa, boa apenas se comparada a outros stories. A visão moderna sobre o pensamento epicurista interessa o filósofo Markus Figueira (UFRN) que classifica esses tipos de desejo, como ter muitos seguidores nas redes sociais, como “sem sentido para Epicuro”. Para Figueira, “o consumismo é produto disso, dessa opinião vazia, dessa imoderação”.

Vive-se pensando em não ficar por fora, em não ficar para trás e se perde a noção do agora. Por isso, Antonio Ikeda, de 21 anos, sentiu que precisava deixar as redes. “Isso não permitia que eu pensasse e sentisse o mundo, era um lugar para fugir do tédio.” Como ele, um a cada cinco jovens se afastou das redes durante a pandemia, segundo pesquisa de 2020 da agência Dentsu Aegis Network. 

Epicuro via a vida na cidade como angustiante, angústia experienciada por Fabiana Camargo, que buscou no budismo um caminho para a tranquilidade da alma. A religião oriental prega, como o filósofo grego, o exame cauteloso dos impulsos, sendo a imoderação a raiz da dor. Mas nem os monges vivem sem emoções, impulsos e desejos. Meditar não é viver sem vontades, mas, sim, controlá-las. “Dá para morar numa caverna e só pensar em grana, ou morar numa casa luxuosa e não se apegar a nada daquilo”, diz Fabiana. 

Renunciar aos desejos em um mundo de estímulos é difícil, mas é a única rota de escape de nossas prisões. O mestre de Fabiana a ensinou: “Somos aprisionados por sentimentos, percepções, impulsos e consciência, que obstruem o estado desperto desimpedido”. Horas após a fala, morreu tranquilo, renunciando ao nosso mundo de ilusões.

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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