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Não mais a incerteza do binário

 

Por Diogo Bachega e Natália Nora

 
Arte: Mariana Carneiro

Che Puri, artista e pessoa indígena de 23 anos, começou a questionar sua identidade de gênero ainda no ensino médio, influenciado por sua amiga travesti Luna. Designado mulher ao nascer, Puri nunca se identificou com o gênero. “Homem”, a única outra opção que conhecia, no entanto, também não contemplava sua existência.

Ele nunca foi um grande fã de matemática e aproveitava o tempo das aulas para investigar o que é gênero na internet. Quando se deparou com a expressão “não-binário”, um termo guarda-chuva que engloba pessoas que não se identificam como homens ou mulheres, enxergou-se no rótulo.

Karine Schluter, médica ginecologista e membro do AmbGen, Ambulatório de Gênero e Sexualidades da Unicamp, explica que a medicina também enxergava a transgeneridade dentro de classificações binárias. Para ela, as identidades que não se encaixam nessa lógica “subvertem ainda mais essa ideia e provocam um novo movimento no sentido da compreensão da amplitude da diversidade aí presente.”

Karine também diz que a medicina passa por uma reeducação para aprender a lidar com pacientes que não se encaixam nos gêneros binários, parte expressiva da comunidade trans. Uma pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp), publicada em 2021, indicou que cerca de 2% da população do Brasil é trans — dessas pessoas, a maioria é não-binária: 1,19% dos brasileiros.

Parte desse pequeno número, Che diz que “a dificuldade começa quando você sai da cama, de casa, e não é enxergado”. Em seu dia a dia, ele enfrenta o julgamento binário das pessoas com quem convive, que geralmente olham para um corpo com seios e entendem se tratar de uma mulher. “É uma luta muito grande para as pessoas deixarem essa visão binária de lado para entender que existem outras possibilidades de gênero.”

É essa dualidade restritiva que também está por trás das dificuldades que pessoas não-binárias enfrentam com a burocracia. Se hoje já é mais fácil para homens e mulheres trans retificarem o nome na certidão de nascimento e em outros documentos, outras pessoas trans ainda não conseguem fazer isso sem complicações — Che conta que precisou entrar na Justiça para conquistar o direito.

Para o artista, todos deveriam questionar o próprio gênero, inclusive pessoas cisgênero — aquelas que se identificam com o gênero designado no nascimento. “Eu queria que todo mundo tivesse essa experiência de se olhar e tentar se ver como gostaria. Todo mundo deveria se questionar de onde vêm esses papéis.”

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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