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Quem é herói?

 

Por Matheus Nistal e Renato Brocchi

 

Nem todos os parabéns são bem-vindos.

Passar no vestibular, conseguir uma namorada e atravessar a rua sozinho. É por coisas assim que Jairo Marques já recebeu efusivos parabéns. As congratulações vêm por causa de uma condição corporal: Jairo é cadeirante desde pequeno. 

Ele é uma das 17,3 milhões de pessoas no Brasil que têm algum tipo de deficiência, o que corresponde a 8,4% da população, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde do IBGE realizada em 2019. Muitos dos pequenos feitos cotidianos dessa população tornam-se, aos olhos incautos, realizações magnânimas: “Não sabia que um cadeirante conseguia tudo isso!”.

O mesmo fenômeno acontece nas redes sociais. É difícil encontrar um post sobre alguém com deficiência que não tenha um comentário sobre o “heroísmo”. Alguém pode se perguntar: “Qual o problema disso? Estou só fazendo um elogio…”. A questão é que, por trás de falas como essa, há um pensamento capacitista.

Isso não significa que não haja desafios ou adaptações necessárias no dia a dia dessas pessoas. Se, por um lado, a medicina incorpora tratamentos e instrumentos cada vez mais avançados — como próteses em fibra de carbono, mãos biônicas e joelhos controlados por eletromagnetismo —, por outro, o tratamento social dado às pessoas com deficiências parece parado no tempo.

A questão é analisada pelo “modelo social da deficiência”, como explica a antropóloga Debora Diniz. Essa escola de pensamento analisa como a pouca imaginação da sociedade acaba por criar as adversidades vivenciadas pelas pessoas com deficiências. Os poucos ajustes da vida social para acomodar os corpos que não são do “tipo funcional ideal e normal”, a chamada acessibilidade, não acontecem como deveriam.

Ou seja: o problema não são os corpos dos outros — com deficiências ou sem —, mas sim nossas pífias maneiras de incluir a todos na sociedade. Dessa forma, apresentar a vida de pessoas com deficiências como simples história de superação é um “alívio na consciência”: “Quando eu considero o outro um herói, eu me livro de uma sensação de ser uma pessoa que não pratica inclusão devidamente”, explica Jairo.

Colunista sobre questões de pessoas com deficiência há mais de dez anos, Jairo salienta que não há “modelos” nem “heróis”: há pessoas que gostariam de se ver mais bem representadas na sociedade. “Cada um tem sua vida, sua realidade, seus caminhos”, lembra ele. E as marcas no corpo —quaisquer que sejam— não deveriam rotular nem limitar.

Colaborador José André Carvalho, protesista e ortesista

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

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