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querido ex-amor,

 

Por Ana Medeiros

 

Arte: Breno Queiroz e Lucas Tôrres Dias

Espero que esteja tudo bem aí na Itália e que esteja curtindo o intercâmbio. 

Já faz uns dias desde que terminamos, eu sei. Mas não queria que nossos cinco anos de história se encerrassem apenas por uma dolorosa ligação.

Lembra de quando perdi minha avó para a covid e, devido ao distanciamento, não consegui dizer minhas últimas palavras? Minha psicóloga falou que alguns rituais, como o velório, são importantes para a gente conseguir se despedir de quem se foi. A forma que encontrei para me despedir de você, e de quem nós fomos, foi por meio desta carta.

Desde que você se foi do Brasil, minha vida tem sido agridoce. Estou muito feliz por você e por tudo o que está conquistando do outro lado do Atlântico, mas também sinto muito a sua falta. Queria saber sobre o seu dia sem me preocupar com o fuso horário, comemorar seu aniversário com você, assim como o Dia dos Namorados, e viver tudo o que você está vivendo também, de perto. 

Mas, para mim, é muito difícil aguentar essa distância. Prolonguei por meses a decisão de terminar nosso namoro pela nossa história, nossas lembranças e por todo o amor que sinto. Quando estávamos perto, éramos inseparáveis. Mas, de longe, as coisas mudaram. Achei que não fazia mais sentido continuar assim.

Fui à casa dos seus pais buscar minhas coisas que estavam no seu quarto. Foi difícil tirar de lá uma parte de mim e lidar com todas as memórias que revisitei. Lembro do dia em que resgatamos seu cachorrinho, o Pipoca, e demos esse nome porque ele não parava de pular de alegria por ter uma nova casa. Eu entendo ele. Sentia que sua casa era a minha segunda casa, e sua família, a minha segunda família. Por isso, também, relutei tanto em dar tchau. Sabia que seria doloroso.

Mas tomei a minha decisão. Você vai viver experiências grandiosas, conhecer novas pessoas e talvez novos amores. E eu não quero parar a minha vida aqui. 

Mesmo que tudo tenha acabado bem entre a gente, acho que naturalmente vamos acabar perdendo contato. Pelo menos, assim, não preciso encarar esse sofrimento todos os dias e acabar voltando atrás na minha decisão. Talvez esse afastamento não seja para sempre e você volte para o Brasil um dia, mas também não quero criar expectativas de que, se isso acontecer, vamos voltar a namorar. Não quero lidar com a dor das expectativas quebradas caso não se torne realidade. Apesar de tudo, vou sempre guardar nossas lembranças.

E você sabe o quanto eu acredito no destino. Vamos deixar nosso futuro nas mãos dele. Quem sabe a gente não se encontra de novo em algum outro lugar do mundo? 

Com carinho, Ana Medeiros

Colaboradores: Lidia Levy de Alvarenga, professora aposentada do Departamento de Psicologia da PUC-Rio e coautora do artigo “Relações amorosas: rupturas e elaborações”, Maria Julia Kovács, professora sênior do Instituto de Psicologia da USP e membro-fundador do Laboratório de Estudos sobre a Morte, Thais Faccio, intercambista nos Estados Unidos, Rafaela Nonato, Emanuele Fernandes, Gustavo Thomaz e Maria Clara Matos, pessoas enlutadas.

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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