
Arte: Luana Takahashi
“Você é a pessoa mais importante daqui hoje, foi bom você ter vindo”, começa o coordenador. Essa é a primeira coisa que um adicto ouve em uma reunião de Alcoólicos Anônimos. Caso a mensagem ressoe, o único requisito para virar membro é desejar parar de beber.
Foi esse desejo que, em 1935, moveu dois alcoólicos nos Estados Unidos a fundarem essa Irmandade e a estruturarem em 12 passos, 12 tradições e 12 conceitos, traduzidos em recuperação, unidade e serviço.
Autossuficiente e independente de instituições, profissionais da saúde ou crenças, o A.A é mantido pelos próprios membros. Presente em mais de 180 países, no Brasil são cerca de 3,9 mil grupos presenciais e 92 online, nascidos na pandemia.
Às 19h30, todos já estão sentados. Com exceção de uma mulher, o resto é homem. “Se o grupo perecer, o indivíduo morre”, declara um deles. Para evitar isso, todos mantêm-se anônimos nos meios de comunicação e na internet.
Para amigos de A.A e não-alcoólicos, revelar a identidade não é problema. Aos membros, manter segredo é a forma de preservar o processo de recuperação e criar um espaço seguro para compartilhar histórias de vida. Para a Irmandade, é o que garante sua sobrevivência.
“Toda a base do programa é a deflação do ego”, diz Lívia Guimarães, presidente da Junta de Serviços Gerais de Alcoólicos Anônimos do Brasil (Junaab). E o anonimato foi a grande sacada para isso.
Ao Claro!, anônimos relatam que nesse processo abdicam da autopromoção e da ânsia por poder, prestígio social e dinheiro. Isso protege o A.A. dos estigmas e das críticas ao comportamento dos que usam a filiação para benefício próprio e mancham a reputação do programa.
A humildade praticada ao aceitar essa condição os ajuda a manter a sobriedade. “Não é só parar de beber, é poder fazer algo sem esperar nada em troca. Isso é o anonimato”, explica um membro.
“Dar de graça o que de graça recebemos” é o propósito primordial do grupo. O único momento em que o anonimato permite uma abertura — e não uma quebra —, é quando um membro transmite a mensagem do A.A. para um alcoólico que ainda sofre.
Final da reunião, todos os participantes em pé. Em uníssono todos recitam, alguns emocionados, outros de forma protocolar: “quando qualquer um, seja onde for, estender a mão pedindo ajuda, quero que a mão de A.A. esteja sempre ali”.
Colaboradores: Membros do Alcoólicos Anônimos, Gabriela Henrique, vice-presidente da Junaab, Alessandra Calixto, vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas.