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Ortorexia: quando ser saudável demais é doença

 

Por Aline de Almeida Novakoski e Guilherme Gama

 

Arte: Adrielly Marcelino e Jorge Fofano

O leite é proibido porque pode ser inflamatório. Carne nem pensar porque um estudo diz que causa câncer. Carboidrato muito menos, porque dizem que engorda. O que resta é a ortorexia. Esse transtorno alimentar é caracterizado pela compulsão por uma alimentação perfeitamente saudável — mesmo que seja inalcançável e adoeça o corpo e a mente.

A busca obsessiva por alimentos “saudáveis” é de causa multifatorial: fatores sociais, genéticos, ambientais e de raiz psicológica, que geralmente começam em dietas muito restritivas.

Naturalmente, quem segue restrição alimentar passa a ficar mais atento aos ingredientes e aspectos nutricionais dos produtos. Mas, a compulsão começa quando uma simples ida ao mercado se torna uma caça às menores porções de sódio, carboidrato e corante, nas letras miúdas de rótulos e embalagens. 

Na mente de quem tem o transtorno, é necessário consumir apenas o que é 100% saudável.  Esse comportamento ganha força com sites e perfis de redes sociais sobre saúde e beleza, que diariamente denunciam os “vilões” da alimentação — fenômeno chamado “terrorismo nutricional”. 

A cada dia, uma nova manchete alerta para um alimento que pode fazer mal à saúde e, para não correr riscos, a saída é comer apenas o que se tem completo controle.

Aos poucos, o carrinho do supermercado fica cada vez mais vazio. São selecionados apenas os alimentos sem glúten, açúcares, aditivos químicos, lactose, transgênicos e assim por diante. Para além do conteúdo nutricional em si, há um interesse exagerado no histórico dos alimentos, antes de chegarem  às prateleiras. Checa-se como foi a produção, colheita, transporte e armazenamento.

E, pela dificuldade em rastrear a comida e “garantir” o nível de perfeição que se exige, a solução é não consumir. O ortoréxico abandona muitos alimentos — e com eles, experiências, relações e, muitas vezes, a vida social. 

São comuns relatos de isolamento. A pessoa passa a se alimentar apenas com a comida comprada e feita por si mesma em casa, geralmente vegetais crus. Ir a um jantar com o namorado não é mais uma opção e ao aniversário da melhor amiga é impensável. 

Nesta lógica de desordem, o bolinho de chuva de infância da vovó é carboidrato de alto índice glicêmico embebido em gordura vegetal transgênica e aquecido em panela que libera teflon. Quando a busca pela alimentação “perfeita” ganha essa dimensão, as consequências são emocionais (depressão, ansiedade etc.) e físicas  —  como desnutrição, que pode acompanhar perda de peso, queda de cabelo, e doenças como osteoporose.

Colaboraram:
Adriana Kachani, nutricionista do IPq-HCFMUSP (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo);
Alessandra Job,  professora de nutrição da Faculdade MULTIVIX de Vitória- ES;
Camyla Rocha, professora da Universidade Federal do Acre (UFAC) e coordenadora do Grupo de Estudo em Nutrição e Comportamento do Acre;
Cecilia Cury, advogada e líder do Põe no Rótulo.

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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