— Filha, qual é a cor daquele seu brinquedo ali na cadeira?
— Azul! — Disse a menina, pintando seus desenhos debruçada na mesa da varanda.
— Olhá pra cima.. Qual a cor do céu?
— Hmmmm. Eu acho que é… Branco? Eu não sei…
O pai virou-se para o cunhado sentado ao seu lado, na cadeira de balanço da varanda, e perguntou:
— Entendeu agora porque os gregos não reconheciam o azul?
— E o que isso tem a ver? Ela é só uma criança. A Grécia é linda, cheia de mar, céu azul, e você quer me convencer que eles simplesmente não viam o azul? Além do mais, ela soube dizer a cor do brinquedo dela!
— Não é que eles não viam o azul. Eles viam, só não notavam. Não tinham necessidade de usá-lo. O céu não é um objeto, não é uma coisa, sabe? Então não precisa dar uma cor. Nem o mar. E tem pouca coisa na natureza que é azul. Eles enxergavam sim, só que não tinham um nome pra ele. Não reconheciam.
— Sei… — comentou o cunhado, mexendo no celular.
— Pensa que tem tudo a ver com necessidade e contexto. A gente primeiro começou a perceber o preto e o branco, para diferenciar o claro do escuro… FILHA, TOMA CUIDADO COM ESSA TESOURA, VAI SE MACHUCAR! Mas então, voltando ao assunto: depois veio o vermelho, por causa do sangue. As outras cores chegaram depois.
— Isso tá um pouco confuso… Eu li uma vez que se não existe uma palavra para descrever alguma coisa, então esse algo não existe. É tipo isso?
— Mais ou menos. Essa é só uma das teorias, tem gente que não concorda. Mas vamos aqui aceitá-la. Por exemplo, se você não precisa do azul, então não precisa nomeá-lo. Se ele não tem nome que o diferencia das outras cores, então não existe. Você já ouviu falar que os esquimós têm várias palavras diferentes para os tons da neve?
— Ei, isso eu li que é boato!
— Pode ser. Mas já serve pra dar o exemplo. Se eles têm várias palavras para o branco da neve é porque eles vivem no meio dela! Eles precisam diferenciá-la. Se um deles pisar em um tipo de neve fofa, por exemplo, pode afundar e se machucar. A gente vê tudo branco porque pra gente é tudo a mesma coisa.
— Tá, sabe-tudo, mas e o azul? — Rebateu o homem sarcasticamente — Por que a gente vê o azul hoje?
— Ué, porque a civilização mudou e progrediu. Fomos conseguindo criar novos pigmentos, novos objetos, e assim novas palavras surgiram para nomear cada cor.
Fez-se silêncio na varanda. O cunhado olhava o céu, contemplativo, quando a menina veio correndo para o colo do pai:
— Papai, olha aqui o meu desenho!
— Ela pintou a árvore de rosa! — Disse o cunhado — Será que ela enxerga as árvores assim?
— Filha, de que cor é a árvore?
— Verde!