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Um futuro preso no passado

 

Por Arthur Macedo e Júlia Rodrigues

 
Ilustração Gustavo Zanfer


Desde antes do presidente Jair Bolsonaro chegar ao poder em 2019, uma minoria dentro da direita brasileira já bradava a favor de uma nova intervenção militar. Para esse pequeno contingente, retornar aos moldes do passado seria a solução para os problemas de hoje. “As pessoas se sentiam seguras para ir e vir”, diz Fernando Carneiro, 62, de Salto, no interior de São Paulo, sobre o período. Essa ideia, que parece vir de um “mundo dos sonhos”, é rebatida por dados do Atlas da Violência, levantamento feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Em 1980, o estado de São Paulo registrou 13,7 homicídios por 100 mil habitantes, bem acima dos 7,3 listados em 2019.

O relato de Fernando se relaciona a um fenômeno descrito por Zygmunt Bauman: a retrotopia. No livro homônimo, publicado em 2017, ele expõe como as mudanças descontroladas da modernidade arrancam das pessoas a crença em um futuro melhor, fazendo-as voltar ao passado. A utopia e a busca por um futuro inexistente dão lugar à projeção de sonhos em tempos antigos.

Para o sociólogo José Maurício Domingues, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), o movimento pela volta da ditadura militar é, além de resultado da crise política que enfrentamos no país desde o início dos anos 2010, um problema de sociabilidade. O avanço de pautas feministas e LGBTQIA+, por exemplo, traz a sensação de ameaça para alguns indivíduos, e o escapismo se torna uma alternativa de proteção pessoal.

Esse mecanismo de defesa não é restrito a camadas conservadoras da sociedade. Há quem se sinta em um ritmo destoante. Os avanços tecnológicos redefinem barreiras de tempo e espaço, tornando o mundo mais complexo. Há 40, 50, 60 anos, direitos políticos e civis hoje estabelecidos ainda precisavam ser conquistados. Mas, ao menos na memória, aquele mundo era mais simples, e isso basta para criar uma imagem positiva na mente. “A gente quase não tinha nada, mas éramos mais felizes”, diz Eliandra Ferreira, 55. Ainda que seja uma nostálgica, é consciente de que seu sonho de voltar ao passado é impossível.

Colaboração Lenira Duarte, José Cunha e Priscila Carmo, contando suas perspectivas sobre passado e presente

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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