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chegou minha vez… e agora?

 

Por Damaris Lopes

 
Arte: Adrielly Kilryann e Guilherme Castro

Apenas 1% dos pretendentes habilitados estão dispostos a adotar um adolescente no Brasil. Por outro lado, existem 2.154 pessoas com mais de 12 anos aguardando um lar. Um dos principais aspectos para essa rejeição é o preconceito de que os adolescentes não conseguem criar afeto com a nova família.

Para Aline Domingues, psicóloga especialista em adoção: “Ao estudar neurociência vemos que o cérebro humano se desenvolve até os 25 anos e na adolescência é possível desenvolver novas habilidades emocionais, como o afeto”. Por isso, os traumas advindos da infância no abrigo e a puberdade podem dificultar a construção de laços afetivos, mas não impedir.

Ingrid Domingues, mãe de dois filhos, decidiu adotar o Vinicius, de 16 anos, enquanto estava grávida da terceira filha, e Sanmya Lisboa, que não desistiu de ser mãe após ter que retirar o útero em uma cirurgia, adotou a Jamile, de 14 anos, são exemplos dessa possibilidade.

“Foi difícil no começo, pois além de estar passando pela puberdade, ele já tinha sofrido muito e tinha dificuldade de se expressar”, relata Ingrid. Não diferente disso, Sanmya conta: “Eu tive que ser resiliente no começo, pois ela havia acabado de perder a mãe biológica e estava passando pela adolescência”.

Os familiares precisam saber que os adolescentes podem ser impulsivos e inseguros durante a puberdade, quando acontecem mudanças na composição física e hormonal de seus corpos. Nessa fase, há um afastamento natural da família para descobrir gostos individuais e formar novas relações. De uma hora para outra, eles só ouvem pancadão, rock ou k-pop.

Além disso, no caso dos filhos adotivos, a puberdade é misturada com medos, o que desencadeia uma série de questões: Por que eles me quiseram agora? Será que vão me devolver? O que é ter uma família?  Para Aline, a principal forma de gerar aproximação em meio a esse turbilhão de sentimentos é conhecer o filho e se interessar pelo que ele gosta e criar um ambiente seguro de aconselhamento e escuta.

Atualmente, Vinicius tem 20 anos e Jamile, 24. Ambos seguem morando com a família que os acolheu na adolescência. Segundo relatos das próprias mães, a “materialização do amor” e a “comunhão” foram peças-chave para criar laços inseparáveis com alguém que elas passaram os primeiros 14 ou 16 anos sem conhecer. 

A identidade na adoção inter-racial

 

Por Bruno Militao, Gabriel Guerra e Maria Luisa Bassan

 

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Arte por Bruna Irala e Mayara Prado

 

 

Na família, encontramos nossas primeiras referências. Mas o que significa crescer sem a identificação compartilhada pela cor da pele? 

 

Colaboraram:

Iberê Dias, juiz da Vara da Infância em São Paulo
Isabel Cristina Gomes, psicanalista e professora do Instituto de Psicologia (IP) da USP
João Victor Navarro, office-boy
Márcio Uesugui, engenheiro de segurança do trabalho, e Bruno Carramenha, ambos produtores de conteúdo no @papais_a_bordo

 

Família que não vem

 

Por Roberta Vassalo

 

Viver longe da família de sangue, a vida em um orfanato e o futuro

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Quem passa pelo km 19 da Rodovia Raposo Tavares não imagina que a construção de paredes cinzentas identificada como “Vila Olímpica Mário Covas“ reserva muito mais do que as quadras esportivas destinadas ao público. Em cada quarto das duas casas alojadas no complexo, três crianças dormem todas as noites, separadas por idade e sexo. Foi lá que Joicy, hoje com 23 anos, viveu entre seus 14 e 18 anos.

 

Joicy conta, sem especificar o episódio, que “perdeu” os pais aos 14 anos. Foi levada, então, com suas duas irmãs para a Associação dos Amigos da Criança pelo Esporte Maior, conhecida por Amem. O abrigo recebe jovens do SOS criança programa público de assistência a crianças e adolescentes carentes e sobrevive principalmente de doações de grandes empresas e trabalho voluntário organizado por seus funcionários. Lá conta que encontrou amparo após o trauma.

 

“Quando eu cheguei lá, como toda criança eu só chorava, era uma crise depressiva. Os funcionários lá procuravam me dar carinho, atenção, então depois eu fui acostumando. Aquela necessidade que eu tinha, aquela falta de ter a mãe ali foi ficando de lado. Como ali tá todo mundo sem pai e mãe, sem ninguém, todo mundo procura te abrigar, cuidar do outro”, lembra ela.

 

A adoção em orfanatos e abrigos chega quase exclusivamente para crianças nos primeiros anos de vida. As que não são acolhidas por uma família crescem por lá mesmo, criados uns pelos outros e pelos ajudantes e funcionários do abrigo. “A gente sente falta de casa né, mas tinha uma estrutura, procuravam dar todo o suporte quando a gente tava triste. Eu tenho contato até hoje com alguns dos funcionários, eles acompanharam a gente desde nova, foi uma parte da minha vida que eu nunca vou esquecer”, comenta.

 

São 46 mil crianças e adolescentes abrigadas atualmente em quase quatro mil instituições de acolhimento no Brasil. O número de jovens registrados segundo o Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas (CNCA), órgão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que se dedica a reunir informações sobre órgãos e entidades de proteção e acolhimento, cresce conforme a idade aumenta. A quantidade de jovens com 16 anos de idade no país em 2013 era 13% maior do que o de crianças com 2 anos, enquanto entre jovens que residem em abrigos, essa diferença era de 86%, de acordo com dados demográficos do IBGE.

 

Os jovens abrigados que não são adotados têm o limite de 18 anos de idade para permanecer nas instituições. Depois disso, têm que sair, construir sua vida do zero. Joicy foi uma das jovens que passou pelo processo.

 

Como a associação em que morou foi fundada pelo dono de uma empresa de turismo, teve a sorte de ser contratada ao sair. Quando chegou à maioridade foi morar com sua tia. Hoje faz faculdade de Relações Públicas e conta orgulhosamente dos anos que sucederam sua saída. Trabalhava desde os 16 anos. Morou até os 20 na casa de sua tia e hoje tem sua própria família, casa própria e carteira assinada. Agora é independente.

 

Ao final da conversa, a moça relembra de seus antigos colegas com um leve sorriso. “Muita gente a gente perde o contato mas bastante a gente procura manter, porque cresceu junto, são amigos, irmãos, a gente morou junto muitos anos. Cada um tem sua vida, as vezes a gente marca de se encontrar pra matar a saudade”.

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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