Com suas mãos ásperas, Gabriel Trevisan corta um “cacho” de cogumelos que brota de um saco cheio de substratos onde os fungos são cultivados, nos galpões escuros e úmidos como cavernas que existem em sua propriedade. O jovem de 25 anos cultivou os cogumelos e construiu os galpões com seu irmão mais velho, Lucas, formado em engenharia florestal. O trabalho é motivo de orgulho, embora ele lamente seus inevitáveis resíduos plásticos. “Não dá para sair completamente do sistema”, admite.
De fato, a vida de Gabriel, que hoje mora em um sítio na estrada de Gavião Peixoto, cerca de 300 quilômetros a oeste de São Paulo, mudou radicalmente em pouco mais três anos. Pode-se dizer que ele deixou para trás um sistema, e agora tenta construir outro.
Formado em aviação civil, foi piloto executivo por mais de dois anos. Mas, embora amasse voar, a realidade não tinha nada do glamour idealizado pelo senso comum. “A competição é imensa, sempre vai ter quem tope voar por menos dinheiro. Cheguei a ter gastrite nervosa naquela época.”
Foi quando Gabriel estava mais exaurido que seus pais compraram a propriedade onde ele vive e trabalha com o irmão. “No início eu conciliava as duas coisas. Eu estava voando para um fazendeiro do Mato Grosso, mas a convivência com ele foi me desgastando. Então larguei a aviação e vim trabalhar de vez na terra.”
Além do cultivo de cogumelos, recentemente os irmãos começaram uma agrofloresta, onde serão cultivados no ritmo da natureza vegetais como bananas, batatas, mandioca e outras plantas frutíferas. “Além de produzir nosso próprio alimento, queremos estreitar a relação entre produtor e consumidor. Muita gente acha ruim pagar sete reais por uma bandeja de shimeji, mas acha normal gastar mais que isso com remédios de que talvez não precisasse se comesse melhor.”
Acordar cedo até aos domingos, espetar o pé em espinhos que perfuram as botas grossas, sujar as mãos na terra, tê-las ásperas de tanto trabalho. A rotina do campo é muito diferente da romantização das histórias que pipocam na internet sobre gente que “largou tudo para viver na natureza”. Mas, para Gabriel, mais que um negócio, seu trabalho no sítio é um ideal, um estilo de vida.
“Se no futuro alguém quisesse comprar o sítio, eu não venderia. Mas ficaria muito feliz de inspirar essa pessoa a fazer o mesmo que eu, retomar o valor da vida no campo, de uma alimentação saudável, de uma vida na qual o maior objetivo não seja o dinheiro.”
Dos tempos de aviador, preserva apenas a foto de perfil no Facebook, segundo ele “mais por não gostar de tirar fotos do que por nostalgia”. Mas a paixão por voar ainda existe, e ele a alimenta com um paramotor, comprado para matar a saudade de tirar os pés da terra. É junto a ela, no entanto, que o jovem mostra que um outro sistema é possível.