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tchau, amiguinho!

 

Por Guilherme Bento

 
Arte: Adrielly Kilryann e Guilherme Castro

Antes de ir para a faculdade, Andy, em Toy Story 3, decidiu que era hora de doar os seus brinquedos. A despedida doeu para os espectadores que acompanharam e se apegaram à relação do menino com o cowboy Woody e companhia.

Na infância, a criança confere a objetos como brinquedos, paninhos e chupetas a representação da figura dos seus cuidadores principais, de acordo com a psicóloga Manuela Moura. É como se eles trouxessem a segurança e o zelo que são associados à família. Esse apetrecho, posteriormente, pode acompanhá-la à medida em que ela é socializada em diferentes ambientes, ajudando a gerar confiança e conforto para descobrir o mundo.

É essa linha que a música tema de Toy Story entoa para falar da relação de Andy com seus brinquedos, em especial no verso “Amigo, estou aqui”, na versão brasileira.

Mas nem toda criança consegue desapegar dos seus objetos de afeto naturalmente com o amadurecimento. Algumas delas prolongam essa relação, porque “podem se sentir inseguras por um tempo maior e demandar mais daquele item”, conta Manuela.

Heitor Oliveira, 34, conta que, por carência e medo, levou um tempo – e várias conversas com sua mãe – até conseguir desapegar de seu travesseiro preferido.

Quando o apego acaba se prolongando, a psicóloga recomenda que os cuidadores tentem identificar o que está gerando insegurança na criança. Seja uma transformação em casa, a morte de alguém, mudanças de domicílio, dificuldade em se separar da família, dentre outros.

Ao compreender a motivação do desconforto, é possível direcionar o desapego. Por meio do diálogo e, a depender do caso, acompanhamento psicoterapêutico, a criança pode entender que a sua segurança e conforto não precisam depender do brinquedo.

Andy reencontra Woody ao longo do filme – não como seu fiel escudeiro contra os monstros e aventureiros imaginários, mas como parte da memória de sua infância, uma fase boa e afetiva. Desapegado, ele passa o amigo para os cuidados de Bonnie.

COLABORADORES: JÚLIA COSTA, PSICÓLOGA, RAQUEL MENDES, PEDAGOGA, DEISE ELIAS, PEDAGOGA, LUIZ MENDONÇA, BEATRIZ LEITE E JADE ELIAS.

Bullying: a dor do diferente na infância

 

Por Ana Beatriz Garcia e Suzana Petropouleas

 
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Arte por Bruna Irala e Mayara Prado

 

 

A violência contra crianças consideradas “estranhas” pode deixar marcas profundas. Foi o caso de João*, que sofreu bullying na infância por sua orientação sexual. O trauma dificultou sua auto-aceitação e refletiu-se em uma necessidade de construir personagens, em busca da aprovação alheia. A experiência também lhe rendeu um Transtorno Obsessivo-Compulsivo grave, com o qual lidou por anos.

 

“O bullying dita muito dos valores e da personalidade futura da vítima”, explica Gabriela Lask, professora do Infantil. A agressão pode assumir muitas formas: é a criança zombada nos corredores por suas roupas ou ridicularizada nas redes sociais, por exemplo. Também pode ser silenciosa, quando a vítima é excluída pelos colegas, e praticada até por professores, como os que reproduzem apelidos sobre traços étnicos de alunos. “A criança está criando seu chão, sua autoestima. Cresce como alguém que não pertence, o que se reflete em outras esferas”. 

 

Essa luta para se adaptar ao convívio com o outro foi exposta por Freud em “O Mal Estar da Civilização”, lembra a psicanalista Beth Coimbra. Ela recebe pequeninos no divã para tratar os efeitos do estranhamento do ambiente escolar, tão coletivo e heterogêneo. Crianças consideradas “diferentes” pela cor ou sexualidade, por exemplo, são alvos recorrentes de violência porque suas particularidades são vistas como falhas por quem promove o bullying – que, segundo Coimbra, aumentou recentemente. 

 

“Há um clima de mais intolerância. E o bullying envolve ameaças, opressão e autoritarismo, mas ele comunica algo sobre quem o promove: o pavor do que há de diferente ou imperfeito dentro de si mesmo”, diz.

 

E quando a família reforça a intolerância? Ana Gabriela Faversani, professora do Fundamental I, atribui à escola o papel de assumir posição condizente com a esfera pública: embora haja famílias com opiniões diversas, a instituição deve tratar qualquer agressão como inaceitável, de forma clara, persistente e consistente.

 

A abordagem pode assumir a forma de sensibilização sobre o preconceito e reorganização das crenças. Para os educadores, a escola também deve garantir que as crianças convivam com a diversidade e incentivar a compreensão de que todos somos diferentes.

 

Esses cuidados são especialmente importantes no atual contexto, diz a psicopedagoga Telma Pantano, em que crianças retornam ao ensino presencial fragilizadas pelo isolamento e ansiosas para serem aceitas. O stress da pandemia, porém, tende a tornar professores e alunos menos tolerantes. 

 

Por isso, o desenvolvimento das competências socioemocionais é essencial, ressalta o psiquiatra Celso Lopes. Em uma turma que atendeu recentemente, por exemplo, os alunos tinham facilidade de criar conexões e “panelinhas”, mas praticavam bullying contra os outros grupos. Descobriu-se que 40% tinham a empatia pouco desenvolvida, que foi praticada através de exercícios como a escuta ativa, em que ouve-se o que o outro tem a dizer com atenção, sem julgamentos ou pensar na resposta pretendida. 

 

Colaboraram:

Ana Gabriela Faversani, professora assistente do Fundamental I no Colégio Equipe

Beth Coimbra, psiquiatra, psicanalista de criança e adolescentes e membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo

Celso Lopes, médico psiquiatra pela UNIFESP e co-criador do programa Semente, que desenvolve o ensino de habilidades socioemocionais para prevenção do bullying nas escolas

Gabriela Lask, professora do fundamental I no Colégio Equipe

Jaqueline Landim, professora do ensino infantil na EMEI Armando de Arruda Pereira

João*, vítima de bullying na adolescência 

*nome fictício

Patricia Della Posta, coordenadora na EMEF João Carlos da Silva Borges

Tania Pantano, psicopedagoga do Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP

Victoria Lopes, professora do fundamental I da Rede Decisão – Unidade Mooca

Profissão: criança

 

Por Breno França

 

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Ela se encontra naquela fase de perder os dentes de leite. E agora, além do banho e da tarefa

de casa, soma­se a janelinha no sorriso tímido. A menina não fala sobre o assunto, mas a mãe

entrega. “Ela  vive reclamando  que  os  dentes  dos  amiguinhos  já  nasceram  e  o  dela  nem  dá

sinal.” Levar pra escola nessa idade  vira o pesadelo dos pais, mas  com a profissão que ela

quer, não dá pra bobear.

Os  cadernos dele  são uma bagunça  só e a profesora tem um trabalho especial para fazê­lo

prestar atenção nas aulas de matemática. A mãe chega em casa à noite e precisa pôr ordem

na  lição  de  casa,  mas  os  desenhos  são  uma  maravilha. “A  gente  foi  obrigado  a  colocar  um

mural no quarto dele antes que ele saísse pintando e desenhando nas paredes.”

Pra  convencer  Sophia  a  ir  pra  escola  é  preciso  treinar  bastante  os  argumentos.  A  avó,

encarregada  do  assunto,  revela  uma  das  soluções  encontradas.  “Ela  disse  que  quer  ser

médica quando crescer, então eu disse que pra ser médica precisa estudar muito. Enquanto

ela  não  mudar  de  ideia,  essa  história  ainda  serve”,  conta  rindo.  Porém,  o  interesse  pela

medicina  surgiu  com  uma  notícia  não  tão  animadora. Diagnosticada  com  uma  doença  grave

aos três meses de idade, Sophia precisou frequentar consultórios desde muito cedo.

No começo do ano, na hora de comprar o material escolar foi uma confusão. Lucas só queria

saber  do  lápis  de  cor  e  das  canetinhas.  “Pra  convencer  ele  de  que  os  livros  também  eram

legais,  eu  tive  que  procurar  uns  desenhos  até  ele  ficar  interessado”,  relata  a  mãe.  Se  a

preferência do menino que quer ser desenhista é pelos desenhos de carro, a família exibe com

orgulho os desenhos que ele fez dos membros da família.

Quando está num consultório qualquer coisa é novidade e motivo de interesse. A mãe conta

que  Sophia  pergunta  de  tudo.  “O  que  as  outras  crianças  têm?  Que  aparelho  o  médico  tá

usando? Ela até já pediu pra mexer no computador do médico, como se ela entendesse.”

Com um lápis e uma caneta como instrumentos e o bloquinho de anotações do telefone, Lucas

quase não pode ser notado na sala. Sua presença só se manifesta quando ele interrompe a

mãe e pede. “A caneta não está funcionado. Me dá outra?”. Passam uma, duas, três horas, e o

garoto não se cansa. O pai revela uma rotina graças ao interesse do filho. “Eu já comprei tantos

gibis diferentes que o jornaleiro até deixa alguns separados pra mim”, conta.

Pra Sophia,  o  médico  precisa  conhecer  cada  parte  do  corpo  humano  pra  descobrir  o  que  a

pessoa tem e dar o remédio certo. “Quando eu crescer eu quero ser médica, porque eu quero

cuidar das  crianças, das pessoas que estão doentes. Daí eu  vou examinar, passar remédio,

cuidar e  ver o que tem que fazer pra elas ficarem boas logo”, imagina animada olhando pra

mãe, que não consegue disfarçar o orgulho.

Já Lucas não parece nada preocupado com o que tem que fazer. Pra ele é muito simples, o

importante é desenhar. “O que eu mais gosto é de desenhar carros. Eu vejo eles na televisão e

faço  parecido,  depois  eu  penduro  no  meu  quarto  e  mostro  pros  meus  amigos  na  escola.” O

gosto do menino por cores fica claro em tudo que ele usa: na camiseta, no tênis, na mochila e

até no óculos.

A vontade de Sophia e a intenção de Lucas nos fazem ter um noção da visão do mundo do

trabalho que eles têm. Mas, com mudanças tão rápidas no mercado e na vida dos pequeninos,

será que tudo vai se realizar?

E você? Conseguiu se tornar o que queria quando criança ou mudou tantas vezes de ideia que

já nem se lembra mais?

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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