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Quando adormecer cansa

 

Por Maria Beatriz Barros

 

MEDICAMENTOS

 

Dores de cabeça e no corpo, baixo rendimento no trabalho, insônia ou excesso de sono estão entre os sintomas que levam os pacientes de estresse a procurarem um médico, em primeiro lugar. “São queixas sintomáticas. Os pacientes dizem estar cansados, estafados, antes de serem diagnosticados com essa doença”, conta o professor Luiz Vicente Figueira, do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP.

 

Isabela Biz, 22, foi ao médico por causa de uma privação de sono e saiu com o diagnóstico de estresse crônico. Desde criança, a estudante não costumava dormir muito, mas seu tempo na cama começou a cair drasticamente a partir de 2011, ao ponto que, quando entrou na faculdade, em 2014, dormia apenas três horas por noite.

 

Em casos como o de Isabela, o médico recomenda a combinação de antidepressivos de uso prolongado com a psicoterapia. Durante colapsos nervosos – quando a pessoa experimenta um pico de estresse agudo, que a impede momentaneamente de desempenhar suas atividades normais –, Figueira explica que o tratamento do estresse é feito pela administração de tranquilizantes por até 72 horas.

 

A promessa de uma vida livre do estresse, no entanto, não vem sem preço. Entre os muitos efeitos colaterais citados na bula do medicamento receitado a Isabela, estão coceiras na pele, náuseas, perda de apetite, amnésia e inquietação – dos quais a estudante experimentou vários. “Quando comecei a tomar o remédio, não conseguia me concentrar. Em menos de uma hora, eu passava de um estado muito sonolento para a total hiperatividade, a ponto de obrigar os meus professores da faculdade a me tirarem da sala de aula porque não parava quieta”, lembra.

 

Entre as vantagens citadas do tratamento despendido para estresse crônico, o médico cita a ausência de risco de dependência do paciente ao medicamento. Isabela, contudo, teme por sua vida sem o medicamento, apesar dos sintomas experimentados nas primeiras semanas terem melhorado com o tempo. “Se eu esquecer de tomar, provavelmente voltarei ao dia 1.”

 

A fisiologia do estresse

 

Por Matheus Morgado

 

estresse

 

Em sua fase inicial, o estresse causa a chamada “resposta de luta ou fuga”: um estado de alerta em que o corpo se mantém preparado para situações de grande gasto de energia, e isso se traduz em maior concentração e produtividade. Esta mesma reação está associada às atividades de caça e busca de alimentos de povos primitivos, o que demonstra que o estresse não é exclusividade do nosso tempo e é consequência normal do organismo. Ele só começa a se tornar um problema de fato quando em excesso.

 

Além da primeira fase, que conta com disparos de adrenalina e cortisol, aumento da pressão arterial e contração dos músculos, o estresse pode se desenvolver em mais três estágios. O segundo diz respeito à fase de resistência, que leva à produção de muito cansaço e falta de memória. As fases finais são as de quase-exaustão e exaustão, quando o corpo não consegue mais resistir ou se adaptar ao estresse e começa a entrar em colapso. É nesses estágios que aparece o risco de desenvolvimento de doenças.

 

Obesidade, hipertensão, depressão, úlceras são exemplos de consequências do estresse, assim como a psoríase, doença autoimune que produz escamas na pele. Não há unanimidade quanto à questão: alguns especialistas afirmam que não parece haver relação direta entre o estresse e o desenvolvimento de doenças autoimunes, apenas a possibilidade de piora de quadros já existentes; mas outros discordam, indicando que essa relação pode, sim, existir.

 

Além disso, segundo a endocrinologista Rejane Vaz, a forte conexão entre os sistemas nervoso, endócrino e imunológico pode desencadear enfermidades silenciosas (cujos sintomas se manifestam tardiamente ou passam despercebidos), como doenças reumáticas, que atingem o aparelho locomotor, esclerose múltipla e distúrbios da tireóide.

 

Colaboraram com a matéria: Dr. Daniel di Renzo e Dra. Rejane Vaz, especialistas em endocrinologia; e Dra. Marilda Lipp, diretora do Instituto de Psicologia e Combate ao Estresse.

Febre de relaxar

 

Por Ana Helena Corradini e Juliana Lima

 

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“Relaxe!”. O imperativo está em nossa mente a todo tempo. Relaxar tornou-se uma obrigação; e a calma, mercadoria de valor. Precisamos encarar com tranquilidade todos os pequenos e grandes problemas que nos assolam; não podemos sucumbir. A simples possibilidade de falhar nesta tarefa gera estresse. Não conseguir relaxar é frustrante. Entramos, assim, em um ciclo vicioso.

 

Afinal, não é normal ficar estressado? Estamos cada vez mais conectados e atarefados, lidando com vários assuntos ao mesmo tempo. Cada um tem suas próprias formas de lidar com o estresse, mas quando ele que nos consome, a solução é adotar um novo lifestyle: aulas de yoga, curso de mindfulness, livros de colorir, spas… As opções são diversas e, às vezes, caras. O estresse sempre volta e continuamos consumindo relaxamento.

 

Relaxar é preciso, mas por que estamos tão preocupados em atingir um estado de espírito em que nada mais nos abale? A resposta não é um grande segredo, todos buscamos ser mais saudáveis, felizes ou mesmo mais produtivos. São cada vez mais populares entre empresas, iniciativas que incentivem o relaxamento de seus funcionários, ajudando-os a se livrarem, ou ao menos relevarem, o estresse causado no trabalho. Com esse intuito, têm se tornado comuns ambientes focados no bem-estar dos funcionários.

 

A ânsia por livrar-se do estresse movimenta uma espécie de mercado do relaxamento, com opções que variam desde técnicas milenares, cujo propósito principal nem sempre é simplesmente relaxar, até adaptações modernas, que em seus discursos garantem uma vida mais tranquila.

 

Nesta edição, o claro! traz algumas dessas inúmeras formas de relaxamento, passando pela simplicidade de uma dieta, a técnicas pouco conhecidas, como o Tantra, ou mesmo as populares meditações Mindfulness. Entendemos as nuances do estresse e os diversos significados de relaxar, que podem ser completamente subjetivos.

 

Eu não quero ir

 

Por Júlia Pellizon

 

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“Eu  ficava  falando  para  mim:  ‘Eu  não  quero  ir,  eu  não  quero  ir,  eu  não  quero  ir’. Aquilo  ia  crescendo

dentro do peito, dando uma angústia. Eu respirava e não enchia o peito”.

Apenas a lembrança faz com que Rita Beatriz Boranga se emocione ao retornar àquele período. Com 25

anos na carreira de magistério, ela trabalhou, de fato, durante 21 anos. Por quatro deles, afastou­se das

salas de aula pelo pavor que sentia ao entrar em contato  com o ambiente de trabalho. Professora de

Química de uma escola estadual no bairro da Mooca, na Zona Leste de São Paulo, Rita Beatriz sofria de

uma  série  de  sintomas. Tontura,  transpiração  excessiva  e  até  diarreia  eram  as  manifestações  físicas,

porém, psicologicamente, sentia­se ainda pior.

Entre 2005 e 2006, ela descobriu a causa: era o próprio trabalho. A professora desenvolveu uma doença

do trabalho, quadro em que o paciente adoece por condições múltiplas presentes no meio de ofício e é

geralmente marcado por depressão e ansiedade. No caso de Rita, os porquês do estado de estresse e

humor  deprimido  se  explicavam  pela  pressão  e  recente  relacionamento  conturbado  com  colegas  e

alunos, diferente do ambiente tranquilo dos anos anteriores. “Eu tinha certeza de que era por causa do

trabalho. Perseguição da direção, coordenação e de alguns professores era intensa. Fora que a sala de

aula não é fácil. O aluno não respeita, não tem interesse, é indisciplinado. Junta tudo em um pacote só”,

explica a professora.

Rita  custou  para  admitir  a  necessidade  de  apoio  profissional.  “De  primeiro  momento,  eu  não  quis

procurar. Achei que não fosse importante, porém chegou um ponto em que eu não entrava na escola e vi

que precisava de ajuda”, conta. Como no caso dela, a demora para a busca de assistência é comum em

pacientes  que  convivem  com  tais  problemas.  Isso  porque  reconhecer  a  presença  de  uma  doença

psicológica  desenvolvida  por  causa  do  trabalho  carrega  um  estigma  social,  de  acordo  o  médico

especialista  em  Medicina  do  Trabalho,  João  Silvestre.  “O  que  chamamos  de  nexo  causal,  isto  é,  a

relação entre a doença e a exposição a um ambiente de trabalho com problemas, deveria ser discutido

com mais frequência, visto que a pessoa passa muitas horas da sua vida trabalhando”.

O ponto decisivo para enfrentar o estigma veio em mais um dos dias difíceis e angustiantes de Rita. “Eu

passei tão mal que eu não conseguia dirigir. Eu tinha medo, pegava o carro e parecia que tudo estava

vindo em  cima de mim”. Foi quando ela foi atrás do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador,

uma unidade do Sistema Único de Saúde. Assim que chegou, foi atendida pelo serviço de enfermagem e

depois por uma psicóloga. “Nunca vou me esquecer do que ela disse: ‘Rita, você está em um grau de

estresse  tão  grande  que  você  vai  continuar  aqui  até  você  melhorar  e  a  gente  conseguir  um

encaminhamento  para  um  médico  particular  ou  no Servidor Público.  Do  jeito  que  você  está,  não  tem

condições de trabalho’”, relata a professora.

Até 2020, a Organização Mundial da Saúde prevê que os quadros mentais sejam a principal causa de

afastamento do trabalhador. Durante os quatro anos em que esteve longe do ofício na escola estadual,

Rita  frequentou  especialistas  como  psiquiatras  e  psicólogos.  Nos  primeiros  meses  com  o  tratamento

corriqueiro  para  depressão,  adaptou­se  às  doses  de  fluoxetina,  antidepressivo  receitado  para  a

professora. Os momentos especialmente críticos exigiam porções maiores do medicamento. “Às vezes

eu parecia um zumbi, porque era uma quantidade cavalar. Praticamente não tinha reação. A Rita estava

escondida atrás do remédio”.

Já se passaram dez anos desde o início da doença. Rita Beatriz retornou à escola estadual que teve de

abandonar,  como  professora  readaptada  desde  o  dia  4  de  maio  de  2011.  Atualmente,  por  escolha

própria, trabalha na Sala de Leitura do colégio. Mesmo com a volta à atividade, ela analisa: “Sarei? Não,

não sarei. Eu não sei se tem cura, não”. Em conjunto com a psicóloga que frequenta, nas sessões às

sextas­feiras, a professora encontra o caminho em exercícios diários para lidar com os medos. “Voltei

firme,  forte,  mas  não  curada.  Eu  ainda  tenho  dores  de  estômago,  estresse  e  sofro.  Tenho  aqueles

sintomas, só que hoje encaro e respondo de outra forma”.

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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