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Até onde vai a nossa língua?

 

Por Amanda Mazzei e Andre Derviche

 

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Amanda Mazzei e André Derviche

 

 

Baixar, deletar e emoji são palavras que, com o tempo, deixaram de ser exclusivas do mundo virtual e passaram a estar entre importantes dicionários pelo mundo. Antigamente, a inclusão de verbetes dependia de uma “sabatina” de cinco anos, para ver se eles pegavam entre as pessoas. Mas a língua abraça cada vez mais rapidamente o que lhe é diferente.

 

Para uma geração que já cresceu falando o “internetês”, “baixar” é comum como vírgula. Porém, a implementação de outras construções que aparecem dentro da língua podem vir acompanhadas de alguns obstáculos.

 

A linguagem não binária, por exemplo, nasceu de uma necessidade. Pessoas que não se identificam com nenhum dos gêneros admitidos pela norma padrão da língua portuguesa criaram uma forma de participar da língua que usam cotidianamente. Na visão de Lysandre, uma pessoa não binária de 19 anos, seria importante que a língua rejeitasse a binaridade de gênero, porque isso mostraria o reconhecimento da existência das pessoas não binárias pela cultura e pela sociedade. 

 

 

As línguas e suas variantes nascem espontaneamente, emergindo das necessidades, usos e práticas. Para Iran Ferreira de Melo, pesquisador em Linguística, a língua é construção coletiva social e histórica sempre em disputa — sempre um processo contínuo enquanto houver falantes. Por isso tantas criações, perdas e reconstruções. 

 

A prova dessa disputa vem na reação às mudanças. Por propor novas designações de gênero, grupos LGBTQIA+ são acusados de “corromper as regras gramaticais”, como o foram no texto do PL 5198/20, que busca proibir o “gênero neutro” em escolas, concursos públicos e bancas examinadoras.

 

 

Fato é que estranhamos mudanças, mesmo em relação a algo naturalmente mutante, como as línguas, cujo começo e fim trocam tanto de lugar um com o outro. Apesar de usarmos a linguagem todos os dias como se fosse mais um membro do nosso corpo, nenhuma língua é pedra lapidada. As criações na língua são constantes na história. O que varia é como elas interagem e são adotadas por diferentes grupos da sociedade.

 

 

O escritor mineiro Guimarães Rosa não foi contemporâneo da maioria das discussões sobre o gênero na língua portuguesa, mas sua inventividade pode nos ajudar a refletir sobre elas. Reconhecido por usar neologismos, brincar com o português arcaico e elementos de outras línguas, Rosa e sua literatura em muito simbolizam a construção social que é a língua: uma obra aberta com várias possibilidades. Ela emerge do mesmo solo que é a comunidade, se ramifica em raízes na forma de vozes e gestos para se transformar de tempos em tempos como as estações do ano.

 

 

 

Colaboraram

Érika Gimenes, formada em Comunicação Social pela Universidade Federal de Juiz de Fora, atua profissionalmente como estrategista de conteúdo.

Fabiana, professora no projeto Girassol, localizado na Zona Oeste de São Paulo, que atua com a alfabetização de jovens e adultos.

Iran Ferreira de Melo, professor na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), mestre em Linguística pela UFPE e doutor em Letras pela USP.

Lysandre, 19 anos, estudante.

Regina Pereira, jornalista e uma das coordenadoras da Oficina de Leitura Guimarães Rosa, abrigada no IEB-USP.

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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