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O que não sai da minha cabeça

 

Por Crisley Santana

 

Luiza estava exausta. Não havia dormido direito, estava muito preocupada, para variar. “E se me demitirem?”, perguntava-se, sentindo o coração palpitar. O travesseiro, naquela noite, não passou de um lembrete de todas as tarefas que ainda estavam por concluir no escritório. 

Nos últimos meses vinha sentindo muita dificuldade de se concentrar, o que fez os afazeres se acumularem. “E se estiverem todos falando de mim, por isso?” inquietava-se enquanto observava os colegas conversarem.

“Ei, Lu. Pode me ajudar com esse item aqui?“. “É claro que não! Estou muito ocupada!” Esbravejou. Sentia os nervos à flor da pele. Não queria ter tratado o estagiário daquela maneira, mas não conseguiu evitar.

A irritabilidade já era parte do seu cotidiano. Tanto, que ficou conhecida como “aquela do pavio curto”. Porém só ela sabia porque se sentia assim. Só ela, e seus músculos, sempre tensos e doloridos.

Foi depois da primeira crise que decidiu descobrir o que sentia. Estava em casa quando aconteceu. Sentiu a garganta fechando, mal conseguia respirar. Deitou-se no chão da cozinha para evitar um desmaio. A sensação de descontrole fazia sentir que o coração explodiria. Chorava desesperadamente enquanto os pensamentos se atropelavam: “e se eu enlouquecer?”

Antes disso, já suspeitava precisar de ajuda, pois seus constantes questionamentos a fizeram sair da faculdade. Não conseguia mais interagir e conviver com aquele estresse diário. “E se não gostarem da minha tarefa? E se não gostarem de mim?”. O estômago chegava a embrulhar. Não era fácil sentir-se tão vigiada.

Talvez não tenha procurado um médico antes por sempre ouvir ser frescura o que  sentia. “É só não ligar para o que pensam”, “não precisa se preocupar tanto”. Sentia-se ainda mais aflita quando ouvia coisas assim. De qualquer maneira, considerou ter sorte. Apesar dos comentários, ao menos sua mãe entendeu porque precisou parar os estudos.

Não era fácil conviver com seu distúrbio. Era difícil admitir para si própria que possuía o tal mal do século, compartilhado por 18,3 milhões de brasileiros. Mas aprendeu a não mais pensar em “e se não fosse assim?”. Precisava admitir: o transtorno de ansiedade generalizada fazia parte da sua vida.

Talvez desde a infância, quando passou a receber apelidos maldosos. Ou por causa daquele relacionamento que despertou-lhe gatilhos. Podia ser genética. Seus pais claramente sofriam do mesmo mal. Não sabia dizer. 

Só sabia que precisava tomar seu ansiolítico do dia e decidir se ligaria para remarcar o horário da terapia. “E se eu faltar para tentar terminar as tarefas? Mais uma vez…”

 

Colaboraram: Carolina Santos Lacerda, Renan Otavyo Ferreira

Fonte consultada: Michelle Binhame, psicóloga clínica

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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