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“Misto, a vergonha do nordeste”

 

Por Bruno Miliozi

 

Arte e Imagem: Iasmin Cardoso e Lucas Zacari


Seu setor no estádio é cercado, sinalizado por flechas que apontam: “vergonha do
Nordeste”. Aliás, mesmo antes de se sentar, ele é lembrado de sua posição sem brio, de
seu ato de desonra, e é recebido aos cantos: “Misto, misto, misto. Tu nasceu no Ceará.
Vira-lata, traidor”.

Assim é tratado o torcedor misto. Personagem comum no cenário do futebol nordestino, o
misto é aquele que, seja por influência midiática ou por resultados esportivos, não doa sua
paixão completa ao clube de sua região, preferindo vestir as cores de equipes de mais
destaque nacional, como as do Rio de Janeiro e São Paulo.

Esse é um movimento antigo que, para Artur Alves de Vasconcelos, sociólogo especializado
em futebol nordestino, tem relação direta com cobertura da imprensa e poderio esportivo.
Afinal, com os clubes do “eixo” jogando e vencendo competições televisionadas, o amante
do esporte tende a criar um vínculo emocional, se sentir pertencente a esse nível mais
distinto do futebol.

Durante grande parte dos anos 80, 90 e 2000, enquanto o Flamengo jogava na elite, todo
domingo à tarde, na TV, com 100 mil pessoas no estádio e craques da Seleção Brasileira
em campo, Ceará, Fortaleza e outros nordestinos brigavam por pontos na segunda divisão
às noites de terça, em gramados precários, para ganharem nota de rodapé nos jornais do
dia seguinte.

No entanto, para os anti-mistos, a identidade regional fala mais alto. Com um discurso de
pertencimento, cresce, alinhada às redes sociais, a ação desses torcedores. Sua principal
argumentação, segundo Artur, é a de que “um nordestino não deve torcer para um time de
outro estado; torcer para time de fora é sinal de ‘alienação’ e tais torcedores precisam ser
‘conscientizados’”.

Lucas Andrade, que zomba com os mistos em seu Instagram “Zorrinha”, explica que a
expressão não tem intenção de machucar, mas “carrega um lance de traição à nossa terra”.
E do outro lado? Ricardo Tavares, misto assumido, é editor-chefe do portal “Futebol
Cearense”. Ele reprova a agressividade de termos como “vergonha do nordeste”, mas
reconhece a importância dos “anti-mistos”. “Só o apoio do torcedor pode fortalecer o esporte
na nossa região”.

Cada um consome o futebol à sua moda. Há quem vá buscar fora, mas há quem prefira o
da raiz, o típico, com cheiro e gosto da sua terra, o futebol que viu crescer. O grito é para
que vejam que o épico, o tradicional, o grandioso, também vem do Nordeste.

Colaboraram:
Artur Alves de Vasconcelos, sociólogo
Ricardo Tavares, jornalista
Lucas Andrade, administrador da página Zorrinha, do Instagram

Entre cascas e gemas

 

Por Vinícius Bernardes

 

 

Consumir um ovo por dia previne infarto. Ovo prejudica o coração tanto quanto o cigarro.

 

Divergências dessa natureza são frequentes em manchetes divulgadas pela mídia.

 

Com construções das mais diversas, muitas notícias têm assumido perspectivas opostas ao transmitirem uma informação. Mesmo cientes dessas discordâncias, as pessoas ainda são fortemente influenciadas por essas construções. As mais exageradas banem o ovo do cardápio. Proíbem sua entrada geladeira.

 

Como se não bastasse, passam a difamá-lo, como um amigo removido das redes sociais. Com uma imagem distorcida, o pobre ovo é relegado a sarjeta, à espera de outra notícia que o recoloque em seu lugar de direito.

 

Não restritas ao fiel companheiro dos cafés da manhã, essas divergências permeiam outras informações. Para o professor Guilherme Sardas, da Universidade de Santo Amaro, a notícia carrega consigo uma aparente neutralidade. Apesar de conferirem uma aura de “verdade absoluta” ao conteúdo noticiado, essas se encontram envolvidas em interesses dos mais diversos.

 

Na era digital, o alcance dessas construções tem ultrapassado os limites impostos pelo espaço e pelo tempo. Bombardeadas por fatos e informações, as pessoas têm sido submetidas a dados frágeis e, em grande maioria, duvidosos.

 

Sardas destaca que essa situação deriva de uma rede em que “há muita informação aparentemente jornalística, mas de fonte amadora e inconsistente, o que gera conteúdos com apurações pouco criteriosas, quando não falsas”.

 

Entretanto, apesar do avanço das novas formas de mídia, imagens construídas pela televisão ainda predominam no processo de informação do brasileiro.

 

Segundo dados da “Pesquisa Brasileira de Mídia 2016”, da Secretaria de Comunicação do governo, cerca de 63% da população diz depender dos telejornais diários para se informar.

 

O professor afirma que esse número é reflexo de um passado recente em que a mídia tradicional tinha o monopólio da informação. Seja em grandes notícias ou no simples ovo, todo fato está envolvido em construções. Ao leitor, resta driblá-las, caso queira enxergar as claras, existentes entre cascas e gemas.

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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