logotipo do Claro!

 

Procura-se sentido | Editorial

 

Por Pedro Henrique Sousa e Vinicius Garcia

 

ilustra-editorial-_v02

Arte por Gabriella Sales e Mariana Catacci

 

Você já deve estar cansado de ouvir a pergunta: “Qual o sentido da vida?”. Exaustivas repetições em filmes, séries, podcasts ou mesmo em conversas no bar com amigos podem passar até um ar de banalidade a uma questão tão complexa. Mas permita que façamos essa pergunta mais uma vez.

 

 A edição claro! Vida pretende trazer essa interrogação tão batida e respondê-la com as diferentes possíveis respostas. Afinal, para alguns um filho é o que dá sentido para sua vida, enquanto que outros veem com aversão a possibilidade de ter um descendente. 

 

Outros vão responder que essa aventura que passamos ganha sentido com uma grande paixão. Daquelas arrebatadoras, que afugentam qualquer razão, e reverenciam as maiores loucuras. Então viver seria sobre sentir demais e pensar de menos?

 

Há quem diga que a beleza da vida está em não ter segundas chances. Acertando ou errando, você só tem uma oportunidade. Mas há quem só genuinamente se motive pela finitude. O que há no fim? O que há depois? Há quem veja grandes glórias ao se preparar para esse momento.

 

E no fim, perguntar qual o sentido da vida torna-se a coisa mais sem sentido. O sentido da vida é aquele que faz mais sentido a você. Mas, se você gosta de frases feitas e metáforas concretas, esperamos que a sua vida seja, para você, como essa edição claro! vida foi para nós. Que comece com ideias, sonhos, como nós pensamos em pautas. Passe por perrengues, lute, se expresse, como fizeram os inúmeros repórteres nesta edição. E que, no fim, você possa sentar, como nós, e escrever um belo editorial, do qual você se orgulhe. Para a gente fez sentido.

 

Expediente – Reitor: Vahan Agopyan. Diretor da ECA-USP: Eduardo Henrique Soares Monteiro. Chefe de departamento: Luciano Victor Barros Maluly. Professora Responsável: Eun Yung Park. Editores de Conteúdo: Pedro Henrique Costa e Vinicius Garcia. Editores online: Letícia Cangane e Pedro Lobo. Editoras de Arte: Gabriella Sales e Mariana Catacci. Repórteres: Beatriz Azevedo, Camila Paim, Danilo Moliterno, Gabriela Caputo, Guilherme Bolzan, Isabel Teles, José Higídio, Júlia Carvalho, Karina Tarasiuk, Letícia Flávia, Marina Reis, Rafael Sampaio, Renata Souza e Vanessa Evelyn. Capa: Gabriella Sales e Mariana Catacci. Endereço: Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, prédio 2 – Cidade Universitária, São Paulo/SP, CEP: 05558-900. Telefone: (11) 3091-4211

 

Minha flor do gravatá

 

Por Rafael Sampaio

 

ilustra-tempo_v02

Arte por Gabriella Sales e Mariana Catacci

 

O velho Renato só contava piadas sujas. Parecia não levar nada a sério.

 

– Faz uma pergunta séria ?

 

– Qual o sentido da vida ? – perguntei por perguntar.

 

Pensou…

 

– Liga pro Chico.

 

Liguei.

 

“A vida é sobreviver.” Com a morte do pai, Chico precisou ajudar os oito irmãos. Em 1970, com 22 anos, saiu de Teresina e foi até Altamira no Pará “abrir a rodovia Transamazônica”. De lá, foi vender relógios no Maranhão, viu um colega ser carbonizado enquanto ambos reparavam uma rede de alta tensão, perdeu um dedo em uma fábrica paulista. Aos 73 anos, ainda sobrevive, limpando banheiros públicos. Valeu a pena ? “Se eu não desisti… mas cê devia falar com a Mazé.”

 

Falei.

 

“A vida pra mim é o cheiro da flor do gravatá”. Explica, Mazé. “Vim da Bahia, conquistei muito em São Paulo, só me falta o gravatá.” Há 50 anos, Mazé saiu de casa “em busca de uma vida melhor”. Insisti no gravatá. “Perto do rio que lavava roupa com minha mãe, no quintal que brincava com meus irmãos, enfeitando a praça nas festas; a flor do gravatá sempre tava lá.” 

 

Queria saber o cheiro da flor do gravatá… 

 

Conhece, Lenira ? “No Recife não tem dessa flor.” Dona de uma floricultura, Lenira tem 70 anos. Casou mocinha, vivia para os quatro filhos e o marido. Então, ficou viúva. “Era feliz e acabou.” Acabou ? “Comecei outra vida, abri a floricultura.” Igual a 40,5% dos lares brasileiros, Lenira virou a chefe da casa. Nada é permanente ? “Minha amiga Cândida diz isso, liga pra ela”

 

Liguei.

 

Aos 20 anos, em 1971, Cândida já lecionava no ensino fundamental. Teve milhares de alunos, “precisei entender que nada é pra sempre”. Sobre voltar no tempo. “Pra quê ? Besteira… pra ver tudo acabar de novo.” Sobre a velhice ? “Tem que aceitar, ficando bem velhinha, com minhas próprias pernas, vou pra um asilo.”

– Descobriu o sentido da vida ? – perguntou o velho Renato ao me encontrar.

 

– Nem devia ter procurado…

 

– Olha… entrei na GM em 1978. Sabe aonde todos os negros feito eu ficavam? Na fundição. O pior lugar. Trabalho pesado, calor infernal. Sabe porque isso ? Porque negro foi feito pra fazer serviço pesado. Conheci três chefes negros em 35 anos de empresa. Ainda hoje, no Brasil, os negros mal ocupam 30% dos cargos gerenciais. Indignado, virei sindicalista. Lutei por mudanças. Claro que perdi também, nunca fui promovido. Mas isso fez e faz sentido pra mim.

 

Acho que Renato encontrou a flor do gravatá dele… só espero não pisar na minha quando ela aparecer.

 

Colaboraram: 

Cândida Campos (70)

Francisco Costa (73)

Lenira Gonçalves (72)

Maria José “Mazé” Jesus (70)

Renato Bento Luiz (74)

Fontes:

Retratos das desigualdades de gênero e raça, IPEA, 2015

Desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil, IBGE, 2019

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

Expediente

Contato

Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, Bloco A.

Cidade Universitária, São Paulo - SP CEP: 05508-900

Telefone: (11) 3091-4211

clarousp@gmail.com