logotipo do Claro!

 

Vozes da quietude

 

Por Gabriel Bastos

 
Ilustração: Thais Navarro

Ilustração: Thais Navarro

Sabe quando você precisa de um consolo e a melhor forma de consegui-lo é de forma silenciosa? Ou então, quando não falar nada numa discussão parece a melhor opção? Pois é, por mais que a gente não perceba, estamos falando a todo momento sem verbalizar nada. Nossos gestos, olhares e linguagem corporal por si só, dizem muito por nós.

 

Ainda assim, sem falar muito, somos compreendidos. Isso porque, “um gesto – realmente – vale mais que mil palavras”. Nos anos 60, Albert Mehrabian pesquisou sobre isso. O professor de Psicologia da Universidade da Califórnia em Los Angeles apontou que 55% da comunicação fica por conta das expressões faciais, quando se trata dos nossos sentimentos e atitudes uns com os outros. Seguindo essa ideia, os outros 38% seriam da tonalidade da voz, enquanto apenas 7% diriam respeito às palavras.

 

Hoje em dia, a ciência entende que é o conjunto de tudo isso que nos permite interagir socialmente. Mas o peso dessa comunicação não-verbal fica evidente numa paquera, como exemplifica Sérgio Kodato, professor de Psicologia Social. Quando há um clima de romance, os olhares insinuantes e gestos discretos são bastante relevantes. Ou seja, só um olhar ou um sorriso podem ser a escolha certa para conquistar alguém, ao invés de palavras, que podem acabar causando um belo de um mico.

 

Até mesmo quando estamos na presença de um médico, o nosso corpo fala. A professora Rosa Maria Mesquita da EEFE-USP observou em seus estudos que além dos exames e diagnósticos, um profissional da saúde também conta com a linguagem corporal de um paciente para saber se ele está doente ou não.

 

Nem pensamos nisso, mas até ao caminhar passamos uma mensagem aos outros. Rosa constatou também que pacientes podem mostrar seu estado emocional através dos passos. E isso ficou bastante claro ao analisar pacientes com estado grave de depressão, que demonstram grande tensão em seus movimentos.

 

Indo além, há quem diga que só nos comunicamos a partir do momento que observamos o rosto de alguém, como explica Deodato Rafael. O jornalista e pesquisador da comunicação comentou uma teoria de que a comunicação só começa quando duas pessoas estão cara-a-cara. Assim, o silêncio, uma expressão facial e aspectos que não verbalizamos seriam bem mais importantes nas nossas relações, por apontar como uma pessoa recebe essa interação. Essa é uma das vertentes de estudo do filósofo francês Emmanuel Lévinas, mencionado por Deodato.

 

Seja através do que o nosso rosto mostra, da forma como reagimos ao mundo e nos portamos diante da vida, ou mesmo ao escolher não expressar o que pensamos, dá pra imaginar que ainda vamos dizer muito, sem pronunciar quase nada. Mas, como defende Sérgio Kodato, “A ausência da palavra, a não resposta, a mudez, tudo se constitui em gesto e mensagem singular, no contexto da comunicação”.

 

Imagine um ambiente silencioso…

 

Por Giovanna Simonetti

 
Fotografia: Wender Starlles

Fotografia: Wender Starlles

Vá lá. Feche os olhos e pense no silêncio. O máximo de silêncio possível. Pronto?

Quais sensações vieram à mente? Tranquilidade, medo, desconforto? 

Uma das principais sensações associadas ao silêncio é o relaxamento. Dentre várias opções para lidar com estresses, a busca por quietude é quase inconsciente e se manifesta de diferentes formas – como um simples fechar de portas, o colocar de fones de ouvido e até viagens pela natureza, retiros e exercícios de meditação. 

Na própria meditação, o silêncio é elemento fundamental. Não o exterior, como estamos acostumados a pensar. Sim, um ambiente silencioso ajuda. Mas importante mesmo é o silêncio interior, diz André Fukunaga, professor de meditação. Segundo ele, o silêncio da mente é essencial para usufruir dos benefícios da atividade (entre eles tranquilidade, foco e autoconhecimento).

A praticante de meditação Stella Garcia conta que silêncio foi fator ativo para o melhor entendimento de suas emoções. Mas o processo não foi exatamente silencioso: ao atingir o silêncio, os próprios pensamentos foram amplificados. “O mais difícil foi ouvir tudo o que penso e ver como somos barulhentos”, relata. 

A bancária Carolina Beolchi teve uma experiência similar em sua viagem pela Floresta Amazônica. Por 15 dias, ela se isolou na selva, sem celular nem energia. “O que eu imaginava ser silencioso, se mostrou mais barulhento do que uma metrópole”, afirma. Sem distrações, tudo era ouvido com mais intensidade. 

Mas a busca por quietude pode também ser assustadora. “O silêncio pode te colocar em contato com coisas que você talvez nem queira”, revela Carolina. Ao mesmo tempo que nos conhecemos, podemos enfrentar traumas, angústias e sentimentos indesejados.

E então chegamos a face oposta ao relaxamento. O silêncio pode carregar uma aura do desconhecido, do estranho. Seu uso no cinema é um ótimo exemplo. O que precede o susto em um filme de terror? Todos nós já ficamos aflitos com cenas em que só é possível ouvir passos, a porta se abrindo ou janelas batendo. Ou quando alguém anda por uma rua deserta – o que é angustiante mesmo na vida real. É a ausência de sons que ajuda a criar a atmosfera de tensão. 

 

Mas não é apenas sobre medo. A principal sensação dessa face é o incômodo. Nossos ouvidos são naturalmente adaptados a procurar sons e a falta deles causa uma ruptura. É como um personagem no cinema que dá um grito sem voz. Ou uma explosão sem barulho. Causa estranheza. 

Talvez não seja tão ruim não poder viver em silêncio absoluto…


Colaboraram: Nathália Janovik, psiquiatra, Marco Dutra, cineasta, e Eduardo Santos Mendes, professor do curso de audiovisual da ECA-USP.

Vaca amarela

 

Por Paula Lepinski

 

Quando se nasce, o grito. É essa a nossa primeira expressão como seres vivos, e daí não paramos mais. Afinal, o que é a vida senão puro ruído entre dois silêncios, o antes de nascer e o após a morte? E com ele partimos sozinhos, pois dos outros um minuto de silêncio é tudo que se pode esperar – nem um segundo a mais, talvez muitos a menos. Na sociedade movida pelo som, o silêncio é crime hediondo, pois a cidade não fecha os olhos. O silêncio amedronta, incomoda e escancara a solidão inerente a toda mulher e a todo homem. Desde o momento em que o despertador toca, a rua propõe uma trilha sonora. E quando ela está longe demais para ser ouvida, um fone de ouvido, um rádio ou até mesmo a voz preenchem o vácuo tortuoso que parece capaz de sugar o próprio ser. Sugar, eu disse? Talvez a palavra certa seja expor. Sim, expor a si mesmo para si mesmo. Numa sala, vinte vozes se confundem – é um debate, eles dizem -, mas ninguém parece capaz de se ouvir antes de falar. Questão de sobrevivência, alguns diriam. O que não é dito e ouvido não existe. E qualquer ruído é melhor do que ficar sozinho e ouvir a si mesmo. Porque calar-se é ouvir a si mesmo. E aí me pergunto: quanto tempo você é capaz de se ouvir?

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

Expediente

Contato

Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, Bloco A.

Cidade Universitária, São Paulo - SP CEP: 05508-900

Telefone: (11) 3091-4211

clarousp@gmail.com