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Sem por cento hétero

 

Por Leonardo Mastelini

 

 

Maria Lima se apaixonou por uma mulher aos 18 anos. Mais do que isso, continuou gostando de seu namorado na época. “Me intitulava ‘100% hetero’. A partir daí, comecei a sentir atração tanto por homens quanto por mulheres”, diz ela, hoje bissexual, aos 20 anos de idade.

 

Para os especialistas, assumir uma orientação sexual diferente depois de certa idade é natural. “A orientação sexual é construída socialmente, com implicações que afetam a identidade individual e social”, explica o terapeuta Juan Macías ao El País. A psicóloga Eliza de Paula vai além: “Pode haver diversas razões. A pessoa pode ter crescido em um meio repressor e, depois, com um pouco mais de maturidade, criado coragem para assumir sua real orientação sexual”.

 

Esse é o caso de Vinicius Santos, de 30 anos, que se considerou heterossexual até os 21. Depois de quatro anos de namoro com uma garota, o produtor cultural percebeu que não poderia mais silenciar a atração pelo mesmo sexo. “Eu tinha construído algo diferente, com o qual não me identificava. O processo foi de descoberta da identidade”, conta.

 

Vinicius acumulava muitos medos quando decidiu dar a notícia aos pais, depois de ouvir críticas sobre uma cena gay enquanto assistia a um filme com a família. Foram dois anos até que o pai se reaproximasse totalmente, mas o episódio abriu oportunidades para um vínculo ainda mais forte e, principalmente, para o autoconhecimento. “Me entender como LGBT foi importante porque só aí fui saber construir exatamente quem eu era. Isso me fez mais confiante, mais seguro para qualquer coisa”.

 

Sobre o passado, Maria afirma que não voltaria a ser hétero e incentiva quem está em processo de transição. “Só vai. É ótimo, porque é parte de quem você é”. Eliza faz o papel de quem recebe, com frequência, pacientes LGBTs em crise em seu consultório. “Independentemente da orientação sexual, o importante é a pessoa se reconhecer e ser feliz. Caso esteja difícil, procure ajuda. Sempre vai existir alguém para isso”.

 

Concreto

 

Por Mariana Goncalves

 

A A U M P O E
R Q U I M A N Ã O
T E T A C O E N T R A
N S T R Ó I Q U N U M A C
A S E Q U A A S A C O
D R A D M O A C A
O S S A D A A

Q U E C O R Q
N S T R O U I T E
E M Q U A T A ( C O N
S E T R Ê S T R U Í D A I
S C U B O M P O N E N
S Q U E P T E C O
R O J E T M C

A M O N C R E
M E I A T O M A C
E S T R U T I Ç O ) N
U R A D E U M P O P O E M
O E M A C O A H Á A P
N C R E E N A S A
T O I D E I A

Editorial: Construção

 

Por Gabriel de Campos e Nelson Niero Neto

 

Construir, desconstruir, reconstruir, e voltar a construir. Nesse ciclo, moldamos nossas identidades e concepções. Mas nada permanece igual para sempre. Mesmo as mais enraizadas opiniões podem se desfazer. Isso, porém, não é simples. Demanda esforço perceber que sua visão do mundo não é a única possível. Às vezes, são os fatos, e não o esforço, que escancaram uma verdade dolorosa e indesejável. Mas desconstruir esses paradigmas é fundamental para evoluirmos como pessoas. Esta edição do claro! se dedicou a esmiuçar esse tema – e esperamos que você faça bom proveito disso.

 

A sua história me constrói

 

Por Carolina Marins

 

 

Um dia desses, estava andando distraído pelas ruas da Vila Madalena quando encontrei Rebeca, uma amiga de infância. Um abraço, um beijinho no rosto e o famoso “quanto tempo”. Para alongar o assunto ela perguntou: “E o Fabrício, por onde anda?”. Eu logo respondi: “Não terminou a faculdade, não arruma um emprego bom. Enfim, não se esforça o suficiente…”. De imediato ela me interrompeu. “Você está sendo injusto, Marcelo”.

 

Sentamo-nos num daqueles bancos de pracinha, de frente um para o outro. Fiquei confuso num primeiro momento. Por que injusto? Ela começou a explicar porque eu jamais poderia me comparar ao meu amigo que veio de uma classe mais baixa. “O mundo foi feito por e para pessoas como você, Marcelo”. “Mas isso não faz sentido”.

 

Mas… Mas… Mas… Eu tentava o tempo todo questionar.
Ela falou sobre como nossas realidades, a minha e a de Fabrício, eram diferentes. Eu, morador de um bairro nobre, com pais doutores. Ele, morador de uma comunidade, irmão mais velho de 5 filhos, de uma família em que só a mãe podia sustentar a casa. “Mas se ele se esforçasse um pouco mais…”. “Ele não tem essa opção”. Segundo Rebeca, eu havia sido criado sob a visão de um discurso meritocrático, em que todos teriam a mesma chance, bastava apenas se esforçar.

 

Se Fabrício deixasse tudo para se dedicar ao seu sonho profissional, como eu fiz, sua mãe e seus irmãos estariam em sérios problemas. Eu sabia que Rebeca estava certa, mas essa conversa estava me causando uma forte angústia, um soco no estômago. Eu estava sendo de fato injusto? Esse tempo todo?

 

Mas… Mas… Mas…
Nunca tinha pensado como que o fato do Fabrício ser negro, vir da periferia e ser de classe baixa minha condição de homem, branco, de classe média e heterossexual tornava o mundo um lugar menos hostil para mim tornava o mundo um lugar hostil para ele. Não era culpa minha, nem da Rebeca, muito menos do Fabrício. “…mas você pensar e agir assim só torna esse mundo ainda mais hostil”, ela falou.

 

Rebeca se despediu e foi embora com as minhas sólidas visões de mundo embaixo do braço. Não que elas estivessem erradas, só não eram “verdades absolutas”, ela disse. Eu fiquei. Com um milhão de dúvidas, sentimentos e pensamentos.

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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