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Abaixo de zero

 

Por Osmar Neto

 

Arte: Nathalie Rodrigues

No Brasil, a cidade de Urupema, em Santa Catarina, tem a menor média de temperatura anual do país com 8°C. Em um lugar tão quente, é impossível praticar esportes que precisam de neve, como snowboard ou esqui. Alguns poucos privilegiados desfrutam de Bariloche, por exemplo, ou viajam para o hemisfério norte em suas férias. Entretanto, existem brazucas que levam esses esportes a sério e fazem do hobby, sua profissão.

Esse é o caso do catarinense Zion Bethonico de apenas 18 anos, que em janeiro conquistou a primeira medalha da história olímpica de inverno do Brasil. Foi um bronze no snowboard, nos jogos da juventude disputados em Gangwon, na Coreia do Sul. O atleta contou que, quando está aqui, ele foca na parte física e trabalha atributos como força e velocidade, mas costuma passar cerca de metade do ano no exterior para manter sua rotina de treinos.

Por conta das questões geográficas, a prática de esportes de inverno por brasileiros é muito custosa e ainda é raridade. Noah Bethonico, que é irmão de Zion e também atleta de snowboard, destaca que algumas despesas são pagas por conta própria. Para quem está começando, os desafios financeiros são ainda maiores.

Outro esporte ainda menos praticado pelos brasileiros é o bobsled, uma corrida de trenó no gelo que se baseia em percorrer uma pista no menor tempo possível. Na categoria “4-man”, Edson Bindilatti, era o piloto da equipe que garantiu o melhor resultado do Brasil na história da modalidade, um vigésimo lugar nos Jogos Olímpicos de Inverno de 2022, em Pequim. Ele também ressalta o alto custo do esporte, um trenó novo, por exemplo, custa cerca de 120 mil euros. Nos jogos de Pequim, por exemplo, o Brasil competiu com lâminas emprestadas e trenó alugado.

Os bons resultados recentes têm despertado a atenção do governo nacional e do Comitê Olímpico Brasileiro. Dos 11 competidores do Brasil em Pequim, nove integram o Bolsa Atleta, programa de patrocínio governamental. Além disso, os atletas acreditam que a tendência é que o COB aumente o repasse de verbas nos próximos anos para a Confederação Brasileira de Desportos na Neve e a Confederação Brasileira de Desportos no Gelo, que também auxiliam financeiramente os atletas

Movido pelo risco

 

Por Rafael Oliveira

 

Não é incomum encontrar alguém que comece a praticar um esporte por recomendação médica, por lazer ou por buscar convivência social em algum grau. Mas há, também, quem procure algo mais. Um frio na barriga; a anormal e prazerosa aceleração dos batimentos cardíacos; uma sensação incomum; a liberdade, de alguma forma.

A infinidade de esportes que vêm acompanhados do adjetivo “radical” costumam se encaixar nessas definições. Para além da endorfina típica de qualquer prática esportiva, se aventurar em um esporte radical é ter a certeza de alcançar sensações que sobrepõem os limites da vida cotidiana, quase que em um humilde desafio à morte.

Maurício Mancuzi não mais sabe precisar com exatidão o que o incentivou a buscar o paraquedismo antes mesmo de se tornar maior de idade. É capaz de afirmar com boa dose de certeza, porém, os motivos que o fizeram continuar. “Quando você é jovem não liga muito para o perigo, na verdade é ele que te motiva a continuar. É o frio na barriga a cada salto. A emoção da decolagem. Cada salto é diferente, são sempre novos desafios e como dizemos: ‘O próximo salto é sempre o melhor!’”, explica paraquedista natural de Santos, mas que hoje reside em Boituva, “capital” da prática no Brasil. “Além disso, tantos sentimentos bons envolvidos no planejamento de um fim de semana de saltos, a viagem, os amigos, estar na área de salto, faz com que você deixe a rotina de lado e também me motivam a continuar saltando”, acrescenta.

Mais do que apenas o flerte com o risco e a euforia espalhada na corrente sanguínea, a liberdade que o esporte proporciona vem da quebra da rotina, do incomum, de um certo encontro consigo mesmo. Para o instrutor e praticante de snowboarding Nicolas Isel, o esporte ocupa justamente esse espaço. “Eu não faço a menor ideia de onde o desejo vem, mas é fantástico fazer isso. Eu me sinto livre fazendo snowboard, me sinto cheio de vida. É como um pequeno momento na minha própria bolha, recarregando minhas energias e vivendo a minha própria realidade, de um jeito que as pessoas não costumam ver”, completa o francês que dá aulas na Suíça.

 

Um lado dos Jogos Olímpicos que ninguém vê

 

Por Vinícius Inácio

 

esportes

“Os treinos aconteciam quatro vezes por semana e duravam quatro horas. Aos fins de semana jogávamos em cidades que não a nossa, viajando por horas”. Se você pensa que essa é a rotina de um atleta adulto, está enganado. É assim que Karina Oliveira, 21, passou a juventude nas quadras. Para ela e outros jovens que almejam disputar uma Olimpíada, a dura rotina de treinos e jogos é cotidiana.

Um salto, um drible e um bloquio, executados à perfeição, escondem a rotina de repetidos movimentos, pulos e quedas, que por vezes levam à lesão crônica. A dor é cotidiana para o atleta, desde as categorias de base até a fase profissional: “Tive colegas que pararam de jogar porque adquiriram lesões. Não sofri com isso, mas me afastei do esporte. Perdi a esperança de me tornar profissional, por exigirem muito de mim. Fisicamente e psicologicamente”, declara.

Para Kátia Rúbio, professora da Escola de Educação Física e Esporte da USP (EEFE) e ex jogadora de vôlei, “é importante que o atleta tenha a clareza de que sua atividade é diferenciada”, que não é possível atingir o nível olímpico “sem viver diariamente o limite”, mas aponta que a exploração do corpo, exigida pelo esporte, pode levar a níveis extremos de desgaste emocional e físico. “Existem clubes preocupados com o desenvolvimento do atleta e que respeitam as especificidades da faixa etária e da modalidade, desenvolvendo a capacidade de competir, de acordo com o indivíduo. Porém, existem clubes que obrigam jovens a executar um trabalho tão proibido quanto o de uma criança que trabalha nas pedreiras de São Tomé das Letras”.

Se o jovem aguenta o ritmo pesado de treinos e jogos, quando adulto a conta chega e o tempo cobra. Caso de profissionais consagrados como Ian Thorpe, cinco vezes campeão olímpico e que juntos às vitórias desenvolveu depressão e alcoolismo. Casagrande, ex-jogador do Corinthians, não esconde que a rotina de treinos, concentrações e jogos contribuiu com seus vícios. Ana Moser pagou com 12 cirurgias a primeira medalha olímpica do vôlei feminino do Brasil, em Atlanta, 1996, e convive com dores permanentes no joelho.

A Olimpíada de Los Angeles, 1984, ficou marcada pela imagem esgotada e cambaleante da atleta norueguesa Gabrielle Andersen que ignorando a dor e o cansaço, atingiu a linha de chegada após 42km da maratona olímpica. A imagem que ficou para a história do esporte não foi apenas a de superação ou do desejo de vencer de Gabrielle. Aquele quadro escancarou o alto preço cobrado a qualquer jovem que decide se tornar um atleta.

Pela TV, vemos a beleza e a plasticidade do esporte, mas para atingir o lugar mais alto do pódio é necessário percorrer um caminho que, junto ao desejo da vitória, traz a dor e a incerteza da derrota.

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

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