logotipo do Claro!

 

Do voto ao like: influência nas urnas e nas redes

 

Por Crisley Santana e Guilherme Roque

 

Os debates e panfletos vistos em tempos de eleição são pequenos detalhes quando trata-se de influência política. Para além desses, há itens que podem explicar como ela se manifesta, apesar de pesquisadores afirmarem não haver fórmula pronta.

Leonardo Barreto, cientista político pela Universidade de Brasília (UnB) e especialista em comportamento eleitoral, ressalta que a influência política está relacionada ao conceito de “espírito do tempo”. As características desejadas pelos eleitores irão depender de um conjunto de circunstâncias da época em questão. Como nas últimas eleições, por exemplo, em que grande parte do eleitorado mirou perfis jovens, que esboçavam renovação e pouca relação com a política.

Esses traços são ressaltados pela comunicação exercida pelos candidatos, outro ponto importante para haver influência, segundo Vinícius Valle, cientista político pela USP e também pesquisador de comportamento eleitoral.

O requisito está relacionado ao conceito de “democracia de público”. Um termo cunhado pelo filósofo Bernard Manin que indica a democracia contemporânea centrada em um líder de massas, com boa oratória e certo carisma. “Ainda que seja um carisma anti-carismático, como é o caso do presidente Jair Bolsonaro”, explica. 

Atuação do eleitorado 

Mas se por um lado a influência é ditada pela atuação dos políticos, por outro ela vem de características sociais e psicológicas dos eleitores. Leonardo destaca que além das preferências pessoais, a indicação de familiares e figuras de liderança, como dirigentes sindicais e religiosos, são muito consideradas.

Assim como identifica um estudo realizado por Vinicius. Em seu doutorado ele aponta o importante papel desempenhado pela igreja, enquanto setor social, “tanto unindo as pessoas e discutindo interesses políticos do grupo, quanto indicando candidatos”.

Quando a influência dessas figuras vira idolatria por parte do eleitorado, torna-se mais complexo identificar os fatores. Mas os pesquisadores apontam que algumas pistas estão nas condições materiais e estruturais que essas figuras passaram durante a vida, além de escolhas políticas tomadas por elas em determinadas situações.

  “Isso depende de uma boa compreensão do espírito do tempo, e de o político ter a sorte de se apresentar como um legítimo representante desse espírito”, comenta Leonardo.  

 

Os líderes nem tão políticos 

Recentemente, a cantora Anitta disse que decidiu estudar política após cobranças por posicionamento de seus seguidores. No momento que essa reportagem foi escrita, ela possuía cerca de 47,3 milhões de seguidores em sua conta no Instagram, aproximadamente a mesma quantidade de habitantes da Espanha, segundo dados oficiais do governo espanhol. Essas pessoas acompanham suas publicações, interagem e, claro, são influenciadas por elas.

“Influenciadores” é apenas um nome novo para algo que sempre existiu: os líderes de opinião. Segundo Mayra Goulart, professora de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), essa liderança tem uma raíz na Grécia antiga, na democracia ateniense, onde a política tinha uma concepção próxima da doxa (opinião). Aqueles que tinham maior capacidade de eloquência, a “capacidade de encantar” e de influenciar, atraíam mais adeptos à suas opiniões. Entretanto, a cientista política afirma que líderes de opinião, os influencers, e os políticos são duas coisas diferentes e que seguem caminhos distintos: “esses líderes não se cristalizam em governantes, a dinâmica de um influencer e de um político profissional é diferente”.

Camilo Aggio, professor do departamento de Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais, complementa o comentário de Goulart e observa que esses líderes, como, por exemplo o youtuber Felipe Neto, que conta com aproximadamente 12 milhões de seguidores no Instagram (e quase o mesmo número no Twitter), têm grande influência dentro de uma certa comunidade, e suas opiniões são vistas como mediadoras pelos membros desse coletivo.

Anitta e Felipe Neto – além de diversos outros influenciadores – têm papel fundamental no aumento de interesse no debate sobre política entre os membros de suas comunidades. “Em razão da quantidade enorme de cobranças, críticas e pedidos de posicionamento que influenciadores recebem, certas pessoas se envolvem com questões políticas. As pessoas acabam se tornando muito mais multidimensionais”, destaca Aggio.

Fica óbvio que a influência dessas pessoas com milhares ou milhões de seguidores é gigantesca, e que cada post nas redes sociais irá ter diversas consequências nas pessoas que os seguem. É o que aponta Cláucia Faganello, mestre em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). A visão dela é de que esses indivíduos nutrem um sentimento de pertencimento à essas comunidades dos quais fazem parte e, por isso, cobram de seus líderes posicionamento por assuntos aos quais tem mais afinidade.

 

Fontes: 

  • Cláucia Faganello, mestre em Sociologia pela UFRGS.
  • Mayra Goulart, professora de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
  • Camilo Aggio,  professor do departamento de Comunicação Social da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

Peças da engrenagem

 

Por Alvaro Logullo

 

 

O Sistema não é uma célula só. O Sistema é um conjunto de elementos que, ordenados, desempenham uma função específica em um todo. Concretos, abstratos, morais, sociais ou econômicos, tais componentes orientam a vida em sociedade. Viver no Sistema é subordinar-se a todos os pequenos subsistemas interligados que determinam nossa conduta e que nos definem padrões, modelos, exemplos, métodos.

 

E o que fazer para sair do Sistema? É possível confrontá-lo? Esta edição do Claro! se propôs a discutir tais questões, em busca de entender qual o nosso papel e espaço dentro desse Sistema. E como somos apenas integrantes de uma engrenagem muito maior.

 

Mata – mata

 

Por Matheus Pimentel

 

Diariamente, alguns distintos senhores e senhoras se reúnem para a já tradicional partida de dominó na Praça dos Três Poderes, pelas bandas de Brasília. A jogatina tem uma só diferença para as das demais praças e calçadas pelo país: é a única televisionada, com milhões de espectadores a observar cada pedra nova disposta sobre a mesa. Já tem gente dizendo que o esporte vai desbancar o futebol como a maior paixão nacional.

 

silhueta3-ai

Vão marcando o placar geral e a coisa parece feia para D, sua dupla titular faz tempo que não aparece na praça. Antes líder do ranking, D ainda não aceita os membros de sua equipe que pularam para o lado de T, que não anda exatamente bem das pernas. J até inventou de mexer com os amigos do arquirrival C, que é do tipo de jogador que não larga o osso.

 

No fim do dia, quando a partida acaba, nem precisam dizer “amanhã no mesmo horário?”, porque bicho velho de dominó sabe que a revanche está sempre marcada para o outro dia. Cada um volta para casa e os jornalistas passam a reportar os bastidores das equipes, treinos, contratações e, mais frequente por esses tempos, rescisões de contrato.

 

Há quem lembre que, em poucos meses, começam as partidas municipais. Mas aí, negócios à parte. Tem gente que, em Brasília, jamais ia jogar junto. O time de D anda dizendo que vai se afastar da trupe de T nos municípios, mas nem tanto, vão “examinar caso a caso”. Ora, é paixão nacional, o importante é somar vitórias pelo país. Lá na capital o negócio segue acirrado e sem data para terminar.

 

D manuseia sua pilha de fichas, que já foi menor, e aguarda uma mão boa para dar all-in. Exilado, C parece ter tirado a carta-objetivo “Destruir totalmente os exércitos vermelhos”, mas há umas boas rodadas só toca nos dados amarelos. Jogando ao lado do filho pequeno, T segue numa sequência de “volte duas casas”. J aposta que foi o Sr. Marinho no escritório, só lhe resta descobrir como. Olho no peões.

Cor x Cor

 

Por Leonardo Milano

 

 

João Mauro Senise é jornalista, mas atualmente trabalha com ativismo e mobilização política no Rio de Janeiro. No dia 13 de março deste ano, foi à manifestação pelo impeachment da presidente Dilma porque acredita que o ciclo do PT no poder deve se encerrar imediatamente. Vestiu-se de verde e amarelo, como a grande maioria que o acompanhou no protesto. “O pessoal de vermelho está na rua defendendo a Dilma, não o Brasil”, afirma.

 

 

Assim como João Mauro, Marcos Hermanson Pomar, residente da capital paulista, saiu às ruas no dia 13 para se manifestar politicamente. Mas, diferente de João, vestiu o vermelho. “Quando eu visto o vermelho, me integro a uma coletividade que simboliza uma série de pautas históricas da esquerda.” Segundo o estudante de jornalismo – que foi a todas as manifestações contra o impeachment da presidente Dilma neste ano – mais do que defendendo o governo, está “lutando pela democracia”.

 

João e Marcos representam muito bem o atual contexto político do Brasil. De um lado, os defensores da manutenção da presidente Dilma. Do outro, os que querem o impeachment. Diferentemente do que ocorreu no movimento das Diretas Já! ou do impeachment de Fernando Collor de Mello, a sociedade está dividida. E, no meio do escarcéu político que se tornou o país, os manifestantes encontraram sua identidade através de três cores. Enquanto o vermelho se tornou símbolo dos defensores do governo, o verde e o amarelo – as cores da bandeira nacional – tornaram-se as referências dos que querem erradicar o PT do poder.

 

Pouca gente sabe dizer, ao certo, qual será o resultado desse embate, e de que forma os  grupos irão se comportar agora que a presidente foi afastada do cargo. Luciano Guimarães, especialista na relação da semiótica das cores com a cultura e professor da ECA-USP, afirma que a utilização das cores nacionais normalmente surge num contexto de retomada do nacionalismo por parte de um determinado movimento. A mobilização pró-impeachment é um exemplo dessa retomada, já que busca construir uma narrativa baseada na ideia de “salvar o país da ameaça petista”. O professor também coloca que a aparente unidade que se dá em torno de ambos os lados é ilusória. “Há todo um conjunto de bandeiras agrupadas que estão usando a mesma cor, o que dá uma ideia de unidade”. As cores, dessa maneira, atuam como aglutinadores.

 

No meio do fogo cruzado, até a tradicional amarelinha da seleção brasileira de futebol, que já trouxe tantas alegrias para o povo brasileiro, está ameaçada. Afinal, sair de amarelo na rua, para alguns, tornou-se sinônimo de apoiar o impeachment de Dilma. Para Luciano, grande parte da mídia tem contribuído para consolidar essa narrativa dualista que contaminou o cenário político nacional , e essa “redução extrema é operada pelas cores”, como nas capas e fotografias.

 

Resta esperar por mais cores na política brasileira.

 

O claro! é produzido pelos alunos do 3º ano de graduação em Jornalismo, como parte da disciplina Laboratório de Jornalismo - Suplemento.

Tiragem impressa: 5.000 exemplares

Expediente

Contato

Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, Bloco A.

Cidade Universitária, São Paulo - SP CEP: 05508-900

Telefone: (11) 3091-4211

clarousp@gmail.com